AUMENTEMOS O VOLUME!!! ESTAMOS SURDOS PARA AS PROFECIAS DO ROCK

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                Perfeição. No ano de 1993, Renato Russo e sua legião, muito além de urbana, cantaram, em bom e alto som, profecias que, perceptivelmente, se realizam diariamente desde então. Aquele poeta do rock, por cada uma de suas palavras na canção, parecia e ainda parece descrever, em detalhes vergonhosos e tristes, segundo a segundo de nosso cotidiano surreal marginal, travestido de cenário de gala, ostentação e purpurina moral. Festejar, na sinestesia dos anos 90, era o verbo que se conjugava como tentativa de emersão de um ambiente cuja densidade tensa sufocava a realidade e, como efeito adicional, oxigenava milhares de sonhos e intensões rebelados. Passados os anos, o ensaio de revolução foi se abrandando, até ceder, cabisbaixo, seu lugar para um profundo cinismo coletivo. Cinismo esse que chega a fazer o brasileiro se auto ludibriar quanto à sua preferência pessoal, no que diz respeito às distintas mitologias, bem como ao Deus que irá admirar: Loki ou Têmis? Enquanto tenta, ao menos, teoricamente, retomar lucidez e nitidez, vai se entorpecendo com os prazeres próprios de Afrodite.

                Renato, em sua profecia musical, mencionou nosso “castelo de cartas marcadas”. Ele nunca foi derrubado porque, diferentemente de muitas moradias tão festejadas recentemente (sempre a festa insana!!!), sua matéria prima vence as investidas do tempo e da razão, o mantendo sempre restaurado à cada disparate proferido, como se fosse piada sem graça, por candidatos à animador da corte e desassossego da plateia. Com o mínimo de vergonha na cara, o sorriso amarelo tupiniquim se escureceria a tal ponto que faria contraste intenso com as torrentes de lágrimas derrubadas por quem ainda consegue manter sensibilidade suficiente para discernimento do seu entorno. O que dizer, por exemplo, do “menino passarinho”??? Para quem ainda não ouviu seu canto, trata-se do menino fluminense (possivelmente, portador de necessidades especiais) que, por alguma razão (ainda em investigação), resolveu se instalar ao lado de uma árvore, a qual está localizada em uma rua do abastado bairro de Higienópolis, na cidade de São Paulo. Segundo vários moradores, até então, o menino não apresentou qualquer tipo de risco aos demais habitantes da região. Porém, mesmo assim, alguns desses habitantes se queixam do fato, aparentemente, não por preocupação com o rapaz e seus reais e íntimos motivos para estar ali, mas porque, tal como verbalizou um desses habitantes, o Higienópolis é lugar para “gente diferenciada”. E, como se fosse quase um complemento para essa justificativa estapafúrdia, outro “habitante diferenciado” alegou que a presença do garoto causa poluição visual no local. Provavelmente, o que, de fato, tem cada vez mais se contaminado por poluição ideológica é o senso humano de igualdade, empatia e fraternidade. Ora...Os ideais de caridade não avançam os limites dos chás ou reuniões beneficentes do high, médium ou low brasileiros? Como também, foi dito em matéria política, divulgada por revista de grande circulação no país, que a mentira é algo esperado na conduta eleitoral nacional. Mais uma vez, Renato encarnaria o profeta póstumo, se considerarmos as palavras “vamos celebrar a estupidez do povo; todos os impostos, queimadas, mentiras e sequestros; nosso pequeno universo”...Infelizmente, de tão pequeno, em nosso universo parece não orbitar muitas outras ideias, além das milhões de mesmices verborrágicas que sustentam a conjuntura atual, as quais poderiam jogar luz no ambiente negro de nosso ceticismo egocêntrico.

                No entanto, como também disse Renato, “o amor tem sempre a porta aberta” e, por isso, nosso futuro pode sempre recomeçar. Recomeço que pode ser proposto em cada acontecimento proporcionado por sensatez e lógica. Um dos exemplos mais recentes é a argumentação final do juiz responsável pela sentença de condenação dos envolvidos no acidente que vitimou o filho da atriz Cissa Guimarães. Em determinado trecho de sua tese, diz ele que, pelo caso em questão, no qual houve presença clara de corrupção e mentiras, “impõe-se uma reflexão sobre o tipo de sociedade que pretendemos para as futuras gerações ou, mais ainda, que tipo de cidadãos somos. Afinal é essa uma das dificuldades atuais da humanidade no plano da ética. De nada vale o Estado reconhecer a dignidade da pessoa se a conduta de cada indivíduo não se pautar por ela”.  Palavras como essas, se aceitas, entendidas e assimiladas podem fazer com que, de alguma forma, o brasileiro desperte para sua realidade, minimizando o risco de ter que, diariamente, temer as influências de Thanatos. Perfeição??? Não...Mas, ao menos, o que tentemos seja pelas vias da sinceridade.

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