O artista do humor

O artista do humor

Poucas pessoas carregam nas veias algum talento artístico. O humor refinado, capaz de fazer rir, é um dom ainda mais raro de se encontrar hoje em dia. Esse gênero de arte no Brasil não tem conseguido se renovar à medida que a velha guarda foi morrendo. Vê-se muito conteúdo apelativo com pouca criatividade e bom gosto. 


Ribeirão Preto perdeu recentemente um artista talentoso, um chargista nato que estava no mesmo nível dos melhores do Brasil e olha que o país tem muita gente boa nessa área. César Augusto Vilas Boas, o Pelicano, 70 anos, morreu de enfarte, deixando uma extensa obra dedicada ao bom humor. Dificilmente alguém via uma charge do Pelicano sem esboçar um sorrisinho no canto da boca. Seus trabalhos foram publicados em vários veículos do país, da imprensa local e na Revide. Desde 2007, publicava seus desenhos na página 2 do Jornal Tribuna, deixando uma coleção de 3.600 charges.


Nada mais desafiador do que fazer rir em tempos em que a raiva, o ódio e a ofensa estão na ordem do dia. Para isso, Pelicano tinha uma fórmula infalível; a sacada inteligente, o humor com um traço simples, o desenho já falava por si só. A palavra para completar a cena era um mero complemento. Na edição de domingo e segunda do Jornal Tribuna, 21 e 22 de agosto, naquele que deve ter sido um dos seus últimos trabalhos antes de falecer, desenhou uma árvore, segurando um balde e pedindo água. 


O humor é um estado de espírito que faz bem para o corpo e a alma. Possibilita que as pessoas vejam o mundo com olhos mais suaves, menos carregados, muitas vezes achando graça do próprio modo de pensar e agir. Em situações adversas, o humor surge como algo capaz de resgatar a leveza, abrindo uma porta para ver a vida com mais otimismo e alegria. Com todas essas propriedades, não se pode duvidar do seu potencial terapêutico. No contexto social, a irreverência dessa arte subverte a ordem estabelecida, mostra o lado cômico e às vezes até ridículo da sisudez e da irracionalidade humana. O bom-humor surpreende e deixa como mensagem final a crítica refinada à ordem política e social. De personalidade discreta, sem muitas palavras, durante muitos anos, Pelicano habilmente nos deu de presente com seus desenhos diários pequenas pílulas de alegria. Foi um mestre na nobre arte de fazer rir. 

Compartilhar: