Uma Big manipulação

Uma Big manipulação

douradoBBBDepois de 60 anos de TV, o Brasil já está se acostumando com a mediocridade da programação, em breve, as exibições do zoológico humano farão parte da nossa cultura televisiva. As trivialidades e as bestialidades que os seres humanos são capazes de produzir confinados entre paredes são espetáculos degradantes e imperdíveis. Ganham repercussão ilimitada quando se escancara a face macabra da degenerescência do comportamento humano. 

Nada mais sombrio do que esmiuçar à exaustão a cena de um pai de classe média defenestrando a filha pela janela. No mesmo ano, em 2008, no interior da Bahia, uma menina pobre foi atirada viva pelos pais em um rio e morreu. Ninguém fez questão de saber porque a menina era de uma família muito pobre, dessas que morrem todos os dias no anonimato. Enquanto isso, as vaidades, as mesquinharias e os preconceitos fervilhavam no caldeirão da sacanagem e da intolerância.

Mas tudo vira “big” quando se tem por trás das câmeras um show “high tech” bem produzido, com direito a indeléveis pitadas culturais do apresentador. O discurso armado antes de cada eliminação faz a plateia crer que a vida é mesmo uma sucessão de golpes, jogadas de esperteza, cenas de fingimento, declarações falsas e sentimentos dissimulados. Tudo não passa de um jogo torpe a ser espiado. Para quem quiser abrir a tampa, a sordidez humana é uma fonte de recursos inesgotável. Basta procurar e franquear as lentes e os microfones para que uma infinidade de mazelas humanas desfile em capítulos ou notícias. Para que servem as nuances do crime macabro? Quem vai se alimentar da xenofobia contra as minorias? Ainda continuam vivas as imagens do Latininho, do sushi do Faustão ou das aberrações que o cândido Gugu adorava colocar no ar. É o show do milhão das apelações mais baratas. No fim, o ciclo se repete. Trata-se apenas de reciclar uma velha fonte. O entretenimento virou o principal produto de consumo, um populacho raso e banal, que nivela o padrão estético por baixo, tentando se esquivar dos respingos da lama que carrega. Na sua rota convergente para o cotidiano, o jornalismo nunca foi um campo isento de manipulação. Não foi e nunca será. Quem tem o controle da mídia mostra só aquilo que interessa.

Crimes ocorridos no baixo escalão da sociedade não merecem debate e investigação mesmo que ocorram aos milhares. Há uma dolorosa inversão neste caminho. Não foi entre o público que surgiu o interesse pela morte de Isabella, clamando por uma produção contínua de notícias sobre o caso. Foi a mídia manipuladora quem construiu esse interesse, levando o público à comoção. Quem preferir pode chamar essa prática de manipulação, mas, no jornalismo, ela atende por agendamento. A mídia precisa, permanentemente, de um tema palpitante para escarafunchar. Depois de explorar até a exaustão, faz o descarte. Afinal, quem, hoje, quer saber da vida do Bam-Bam ou do garoto João Hélio, aquele menino que foi arrastado por diversas ruas no Rio de Janeiro, preso ao cinto de segurança de um veículo? Em assim sendo, resta para essa plateia esperar pela próxima tragédia ou pela 11ª edição BBB. 

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