Nossa constante construção

Nossa constante construção

Há alguns dias comecei a reparar no prédio que está sendo construído ao lado de minha casa. Vocês já pararam para observar alguma construção? Eu me refiro a qualquer processo de construção. Pode ser de um prédio, de uma casa, de uma área de lazer, de um cômodo a mais na casa ou algo do tipo. Eu achava que já havia reparado, mas esses dias percebi que na verdade muito pouco havia observado sobre estes eventos. Sabe, estou dizendo daqueles momentos em que observamos mesmo e não só olhamos enquanto pensamos em outra coisa. Depois desse singelo exercício de realmente ver, o que aconteceu depois de meses em que eu só passava pela construção, me peguei pensando sobre o quanto é necessário tolerância e paciência para que algo venha a ser construído. Diariamente vejo os pedreiros, mestre de obra, engenheiro, encarregado e mais uma série de pessoas circulando pela obra. Às vezes está um calor danado com muito sol, às vezes há chuva, às vezes há uma brisa gostosa e, quase todos os dias, com os diferentes climas e intempéries, eles lá estão, firmes e fortes, mantendo o processo de construção.

Quando parei para vê-los, isso foi o que roubou minha atenção. Parece tão óbvio o fato de que um prédio não se constrói de um dia para o outro, mas na prática não sei se é bem assim. Por um lado, quando realmente parei para notar, vi que este estava bem maior do que eu imaginava, mas por outro lado parecia tanto trabalho para poucos andares a mais. Que sentimento ambivalente! Está grande ou pequeno? Está indo rápido ou devagar? Tanto sol, chuva, cansaço para apenas um andar? Ou seria, um andar que definitivamente vale todo o desgaste e dedicação?

Nós, humanos, costumamos ser afoitos, ansiosos, diria até gulosos e sedentos por retorno, resposta, conhecimento e, como não poderia ser diferente, construção. Podemos pensar em alguns exemplos simples do dia a dia. Quem aguenta ficar muito tempo em alguma fila? Eu, pelo menos, já desisti de comprar muitas coisas devido à fila que tinha que enfrentar. Quem nunca viu os apressadinhos do trânsito que parecem ter mais urgência que qualquer ambulância para chegar em algum lugar? Se é que conseguem chegar com toda essa pulsão de morte.

E, indo mais fundo, mais no íntimo do nosso ser, podemos encontrar diversas nuances dessa busca desenfreada por apaziguamento de um troço estranho, difícil de dar nome e de descrever, o qual será chamado aqui de angústia, que está relacionado justamente com essa busca desmedida de estar pronto e resolvido, o que na dura realidade da vida nunca, jamais se findará. Há aquele ditado que diz: "o que não tem solução, solucionado está". Fácil de falar, mais ainda de decorar e repetir, mas em seu íntimo há uma dor que clama por solução. Não é fácil viver em meio ao desconhecido, ao não resolvido, ao não construído e pior ainda manter-se firme nas construções diárias sabendo de todo o esforço que será necessário. Não é à toa que vemos tantas construções abandonadas em nossas cidades. O que será que acabou? Muitos falam: a verba! É, penso na grande verba necessária para bancar uma construção. São tantos processos, materiais, trabalhadores e, ainda, há de se lidar com as adversidades que por muitas vezes atrasam ou desfazem o que foi feito no dia anterior. Não é trabalhinho simples esse não!

Nos construir, diariamente, é tarefa dificílima e que nunca terá fim, a não ser com a morte. Vida e morte, dois lados de uma mesma moeda. O platô tão desejado por nós, em que não se tenha altos e baixos ou tantas descidas e subidas só pode ser encontrado na morte, porque em vida, minha gente, é um sobe e desce, é tijolinho atrás de tijolinho, é nivelamento de terreno e, se o que se deseja é uma construção grandiosa, há de se investir muito tempo em preparação do terreno. Muitos dias serão dedicados à única tarefa de tirar terra e, tirar mais terra e, mais terra para que se possa ir cada vez mais fundo, aprofundando o buraco em busca de um firme e bom solo. Só assim será possível base para sustentação.

Haja energia para ser operário da própria vida, hein? Mas será que há também sentimento mais potente do que este de se perceber mestre de sua própria obra? Como toda boa ambivalência, esta também não haveria de ser diferente. É preciso muita tolerância para não desistir e muita paciência para enxergar, em meio ao caos, as inúmeras matérias primas que possuímos, mas que precisam ser trabalhadas, com cuidado e atenção, artesanalmente, dia após dia, em um constante processo de construção.

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