DECISÃO JUDCIAIL DE SEGUNDA INSTÂNCIA CONDENA FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS POR FALTA DE ACESSIBILIDADE EM PROVA

DECISÃO JUDCIAIL DE SEGUNDA INSTÂNCIA CONDENA FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS POR FALTA DE ACESSIBILIDADE EM PROVA

Decisão da 4ª Turma do TRF da 4ª Região reformou em parte a sentença de primeiro grau - proferida na Justiça Federal do Paraná - e julgou parcialmente procedente uma ação que discorre sobre as dificuldades que até mesmo a administração pública impõe às pessoas com deficiências.

O julgado condenou a ré Fundação Carlos Chagas a pagar ao autor uma reparação moral de R$ 19.654.

Tendo perdido a visão na infância, Márcio Cruz - que pretende futuramente ingressar na magistratura - conseguiu concluir os estudos e, atualmente, trabalha como analista judiciário do TRT-9, desempenhando suas funções junto ao desembargador Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, que também é pessoa com deficiência visual.

Para entender o caso

* Em 11 de abril de 2010, o bacharel em Direito Márcio Cruz, deficiente visual, participou de concurso público para analista judiciário do TRF-4, organizado pela Fundação Carlos Chagas. Ao final, ele ficou na segunda colocação entre os candidatos com deficiência. A vaga era uma só.

No local da prova, Márcio identificou que o programa Jaws, que seria utilizado por ele, não estava corretamente configurado. A solução parcial demorou cerca de uma hora.

Também, ao ser apresentado à sua ledora, Márcio soube que ela não estava preparada para o ofício; não recebera qualquer treinamento da Fundação Carlos Chagas para atuar no atendimento de uma pessoa com deficiência visual. Este despreparo resultou em erros de leitura, de pronúncia, e de transcrição do gabarito da prova objetiva. Também ocorreram erros grosseiros de acentuação e ortografia na transcrição da redação.

* Essas e outras falhas da FCC foram graves e prejudicaram Márcio. Ele tivera uma pontuação na prova objetiva maior que o primeiro colocado; assim, a pontuação da redação era determinante para o resultado do concurso.

* Após o recurso, a FCC reconheceu que corrigira a prova transcrita pela ledora. Então ´corrigiu´ a prova impressa feita por Márcio, mas manteve a nota.

"Estas situações demonstraram que houve grave violação do princípio da isonomia, pois não foram garantidas a Márcio as mesmas condições que aos demais candidatos que encontraram o programa Jaws devidamente configurado, ledores preparados e com experiência - e o crucial, não ocorreu a transcrição da redação pela ledora" - diz o advogado Alexandre Bazanella (do Escritório Bazanella & Rissatto Advogados. de Maringá-PR), que atua em nome do autor da ação.

O profissional da Advocacia avalia que "para o deficiente visual o fornecimento do programa Jaws, de ledora devidamente treinada, com boa leitura e pronúncia, é fundamental para que ele pudesse ter realizado a prova com nas mesmas condições que os demais candidatos".

Bazanella diz que, "no plano prático - embora sem reverter a expectativa de que alcançaria a nomeação - a sentença confortou o autor, pois foi uma resposta digna do Judiciário frente a uma situação grave de desrespeito a seus direitos fundamentais".

O voto do relator

No julgamento, o desembargador federal Cândido Alfredo Silva Leal Junior, do TRF-4, trouxe um recente mau exemplo colhido dos registros da imprensa e das discussões nas redes sociais: um veículo a serviço da Prefeitura de Porto Alegre - e portanto em missão oficial - foi estacionado em local proibido no Parque Moinhos de Vento e obstou o deslocamento de um cadeirante, que ficou prejudicado para retirar seu veículo, que antes estacionara regularmente em vaga especial.

O motorista infrator estava a serviço do prefeito José Fortunati e, minutos mais tarde quando localizado, desculpou-se e disse que "cumpria ordens", ao estacionar ali.

Discorre o magistrado que, "se no plano genérico das normas abstratas parece que vivemos no melhor dos mundos acessíveis possíveis, quando se trata de conferir na vida cotidiana diária se a acessibilidade realmente é uma realidade, o que percebemos é que a vida do portador de deficiência não é tão fácil quanto o mundo das normas promete".

"As vagas reservadas a portadores de deficiência não são respeitadas pelos cidadãos nem pelo Poder Público" - arremata o acórdão.(Proc. nº 5001394-62.2011.404.7003).

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