A reação das prefeituras

A reação das prefeituras

Com menos arrecadações e repasses, prefeitos de Ribeirão Preto e região contam a receita para manter funcionando a máquina pública

Não é de hoje que a crise financeira vem crescendo no país e, já no ano passado, prefeituras da região começaram a reagir, tomando uma série de medidas para conter seus efeitos nos municípios. Além da queda dos repasses financeiros estaduais e federais, os prefeitos precisam lidar com os desequilíbrios causados pelo aumento das taxas de inflação e desemprego, que aumentam a demanda nos serviços públicos, e com a retração do mercado, que já não conta mais com os inúmeros incentivos dados anteriormente pelo governo para manter girando a economia. Em relação à região de Ribeirão Preto, ainda há outro agravante, a crise do setor sucroalcooleiro: 90% das cidades dependem do segmento.

Em Pontal, que tem um orçamento de R$ 76 milhões para este ano, R$ 3 milhões a menos do que no ano passado, e uma inadimplência em torno de 65% nas contas de água e IPTU, o prefeito André Luis Carneiro, desde 2014, passou a tomar medidas para conter os efeitos da crise, demitindo 14 de seus funcionários comissionados, inclusive o diretor do Departamento de Cultura. Com a iniciativa, André pretende fazer uma economia de R$ 455 mil no ano. Porém, as ações não pararam por ai: também reduziu as horas-extras e demitiu o secretário do Meio Ambiente, acumulando no gabinete essa função.

Conforme o prefeito, a crise brasileira afeta as prefeituras com grande queda nos repasses financeiros estaduais e federais e ainda agrava os serviços públicos com aumentos de custos na área da saúde, da educação e social, pois muitas famílias e empresas abandonam os planos de saúde e migram para a rede pública municipal. “O segmento mais atingido na região foi o setor sucroenergético. Junto com a crise, chegou a mecanização, com demissões em massa e a diminuição de mão de obra braçal, e a falta de estímulos para investimentos pelo baixo preço e defasagem do etanol e do açúcar, que também resultou na redução do preço pago ao produtor de cana”, ressalta André.

O principal desafio do prefeito de Pontal, agora, é manter os serviços essenciais para a população, combatendo a inadimplência e buscando gerenciar, criteriosamente, o dinheiro arrecadado, mas André reconhece que se as receitas continuarem caindo, há a possibilidade de reduzir alguns serviços prestados. “Hoje, a inadimplência chega a 70%. Os munícipes nunca pagavam seus impostos, pois não resultava em nada. Como medida alternativa, implantaremos no cavalete de água das residências, cujos proprietários não pagam os impostos, um redutor de vazão, para fazer com que parcelem os valores devidos e paguem em dia”, conta o prefeito que, no início de 2013, implantou o REFIS, um refinanciamento das dívidas em até 36 vezes, com redução de juros e multas, que já está mostrando resultados em relação à inadimplência.

Além da redução dos gastos em geral, a Prefeitura de Pontal mudou o formato das duas grandes festas da cidade: não realizou o baile de Carnaval que oferecia à população quatro noites de folia, deixando a festa restrita à animação dos blocos da cidade; e reduziu a realização da Feira Comercial e Industrial de Pontal (FECIP), que até 2013 se prolongava por quatro dias e contava com a presença de cantores famosos, para um dia em 2014, com a participação de músicos da cidade.

Em Serrana, conforme o prefeito João Antonio Barboza, conhecido como Tonhão Candoca, “o dinheiro sumiu do mercado”, e várias empresas reduziram custos, ocasionando um aumento no índice de desemprego. “A Prefeitura assumiu alguns encargos que eram dos governos estadual e federal, assim como as dívidas de governos anteriores. Além disso, várias empresas da cidade fecharam as portas, a inadimplência das contas de água é alta e o repasse do Fundo de Participação dos Municípios foi reduzido. Enfim, muitos fatores estão prejudicando o município”, avalia. Esse cenário causou a queda na arrecadação municipal, fazendo com que a Prefeitura conviva com consideráveis perdas.

Porém, os problemas vão além: diante da crise nacional, muitos fornecedores temem contratos com a administração municipal e, sem participantes nas licitações, os serviços públicos são prejudicados, conforme Tonhão. Até o momento, os segmentos mais atingidos foram os ligados à geração de emprego, tanto na área comercial quanto na industrial, com vários empresários encerrando ou reduzindo suas atividades. “Quando uma usina fecha as portas, como é o caso da usina Nova União, que há dois anos não produz, a cidade perde muito, pois além da arrecadação de impostos, a movimentação do dinheiro no comércio fica prejudicada. Não é possível precisar o tamanho do déficit, mas ele é bem significativo”, afirma o prefeito de Serrana.

Diante dessa realidade, Tonhão busca manter a confiança do munícipe, o equilíbrio das contas públicas e oferecer serviços públicos essenciais de qualidade. “É difícil fazer com que a população entenda que a Prefeitura depende de arrecadação, de repasses, e que por mais que enxugue a máquina pública, que corte gastos, esses fatores prejudicam o equilíbrio financeiro. Em 2015, a receita tende a se manter em queda. Por isso, precisamos trabalhar para que os cortes atinjam somente despesas não obrigatórias, que não comprometam o custeio da maquina pública em seus serviços”, analisa o chefe do Executivo.

Tonhão ressalta que com a queda de arrecadação e a necessidade de cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal, governar corretamente incomoda muita gente e ele está enfrentando dificuldades, pois nem sempre tem recursos para pagar fornecedores, que interrompem serviços importantes, como a limpeza e o recapeamento asfáltico. “Optamos por fazer o certo, cumprir a lei. Em situações economicamente favoráveis, isso já é uma tarefa complicada. Sob a pressão de uma crise financeira, é quase impossível”, revela.

Para evitar desdobramentos mais sérios e manter serviços fundamentais funcionando, o prefeito de Serrana optou por demitir servidores comissionados, cortar gratificações, criar mecanismos de contenção de despesas, colocar a fiscalização na rua para que as empresas fiquem em dia com suas obrigações tributárias e está estudando uma maneira de acabar com a inadimplência em relação às contas de água. Com o aumento da arrecadação, Tonhão acredita que poderá melhorar a qualidade de alguns serviços relacionados à Saúde e à Educação. Medidas positivas também estão sendo tomadas: a Prefeitura de Serrana tem buscado empresas para atuar no município e gerar empregos, e está oferecendo cursos profissionalizantes para qualificar mão de obra e ampliar os contatos com novas fontes de empregos local e regional, tentando viabilizar a volta de muitas pessoas ao mercado de trabalho.

Com as ações propostas, Tonhão conseguiu reduzir gastos e equilibrar a folha de pagamento, mas a queda de arrecadação ainda é um entrave a ser superado. Para tanto, está orientando secretários e equipes para que atuem com economia, elaborando projetos de arrecadação e de parcerias, de forma a poder oferecer à população um serviço, eficaz e de qualidade. “Estamos empenhados na recuperação da Usina Nova União, com o objetivo de fazê-la voltar a moer ainda esse ano, gerando pelo menos mil empregos diretos, e em conseguir trazer para Serrana uma empresa metalúrgica para ocupar o lugar de outra que foi fechada devido à crise”, ressalta Tonhão.

A recessão e a queda de arrecadação também vêm causando problemas à Prefeitura de Ribeirão Preto, conforme a prefeita Dárcy Vera. “No ano passado, o município deixou de receber R$ 31 milhões em repasses do ICMS e houve perdas com o Imposto sobre Transferência de Imóveis (ITBI) na ordem de R$ 8,1 milhões, em um sinal claro da queda de atividade econômica no município”, afirma. Só neste ano, entre janeiro e fevereiro, o Município perdeu R$ 10 milhões na arrecadação, relativos ao ICMS e ao IPVA. Segundo Dárcy, R$ 19,6 milhões de recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) ficaram retidos em decorrência de uma dívida da Cohab assumida nas administrações anteriores. Em dois anos, foram retidos R$ 32,7 milhões de recursos do município, que hoje sofre com uma perda de receita de R$ 71,8 milhões, um impacto considerável nas finanças.

Com medidas tomadas em 2014, Dárcy conta que conseguiu economizar R$ 28 milhões, um valor significativo, porém insuficiente, para enfrentar o agravamento da crise econômica. “A queda brusca na arrecadação comprometeu a capacidade de pagamento da Prefeitura, que atrasou o acerto com fornecedores, dívidas que estão sendo liquidadas no início deste ano. Porém, desde o ano passado, a Prefeitura de Ribeirão Preto vem tomando iniciativas para conter as despesas”, ressalta a prefeita. Entre elas está a determinação de redução de despesas gerais, de energia, de água e de combustível em 20% nas secretarias, autarquias e empresas, sem deixar de atender à população, e a proibição da participação de servidores em cursos e congressos que tiverem custos para o Município.

No dia 11de março, Dárcy anunciou outra série de medidas que objetivam reduzir as despesas em R$ 10 milhões ao mês. “As novas medidas não afetarão a prestação de serviços. Não serão prejudicados os atendimentos em escolas municipais, em unidades de saúde, na limpeza urbana, na iluminação pública, nos serviços funerários, na coleta de lixo, ou seja, nenhum serviço essencial sofrerá interrupção. Os cortes serão realizados com a demissão de funcionários comissionados, reduções de contratos, fusões de secretarias, entre outras ações”, assegura a prefeita.

O prefeito Zezinho Gimenez, afirma que, em Sertãozinho, a crise financeira atingiu a cidade como um todo. Foram afetados o comércio e o setor sucroenergético, que sofreu um grande impacto com a demissão de funcionários, o que ocasionou uma queda na arrecadação de impostos do Município, principalmente do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) e do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS). “Uma parcela da população, que antes contava com a rede particular de saúde e de educação, acabou migrando para os serviços públicos e houve um aumento da demanda”, ressalta.

Devido à expressividade da cadeia produtiva do setor sucroalcooleiro no município, as indústrias de equipamentos foram as mais prejudicadas com a crise. Somente no ano passado, foram demitidos quase três mil funcionários, um fator que afetou o comércio local e a prestação de serviços, em um efeito cascata. Zezinho ressalta que momentos como esse requerem uma análise da situação, muita reflexão e o estabelecimento de metas que devem ser postas em prática. “É isso que estamos fazendo desde o primeiro ano de nosso governo quando, em agosto de 2013, organizamos um ato público, em prol do setor sucroenergético, em queforam convocadas lideranças de diversas esferas para lutarmos não somente por nossa cidade, mas por toda a região”, aponta, assegurando que com essas ações conseguiram a adesão de muitos interessados em defender os interesses das indústrias e dos trabalhadores do município.

A administração também buscou, junto à Câmara dos Deputados e à Assembleia Legislativa, o respaldo de deputados estaduais e federais que apoiaram as reivindicações, criando duas frentes parlamentares em defesa do setor. “No ano passado, quando a crise se agravou, convocamos os representantes do comércio, sindicatos, empresas de planos de saúde, supermercados da nossa cidade e estudamos medidas para que cada um desse sua contribuição aos moradores, em especial, àqueles que acabaram de perder seus empregos”, conta Zezinho. A ação denominada de “Pacto Social” foi fruto de um esforço muito grande de pessoas e entidades envolvidas. A etapa a seguir dessa ação culminou, em janeiro passado, em uma grande manifestação que reuniu milhares de pessoas. Um dos objetivos da passeata foi chamar a atenção do Governo Federal para o setor, do qual muitos dependem.

Apesar de todos os fatores adversos, o prefeito acredita que a qualidade dos serviços prestados em Sertãozinho não será afetada, devido ao quadro de funcionários públicos comprometidos e, constantemente, motivados a atender a população da melhor forma possível. “O aumento da demanda provoca alguns atrasos no atendimento, especificamente no caso da saúde, mas estamos atentos a isso e acompanhando de perto, pois entendemos que o assunto saúde é primordial a todos”, salienta Zezinho.

Para evitar maiores impactos, o prefeito junto à sua equipe da Secretaria da Fazenda acompanha de perto o cenário da economia nacional e municipal. Nos dois últimos anos houve uma queda de R$ 30 milhões na arrecadação do ICMS e a receita municipal, nos dois primeiros meses deste ano, caiu 3,94% em relação ao orçamento previsto. A Prefeitura deixou de receber R$ 2.280.000,00, o que levou Zezinho a tomar medidas mais firmes e assertivas: “Fizemos um contingenciamento do orçamento de 10% de custeio, demitimos 15% dos cargos comissionados, não substituímos funcionários concursados que se desligaram da Administração Municipal, os contratos da Prefeitura estão sendo renovados sem a correção da inflação do ano e tivemos que adiar o início de algumas obras”, conta o prefeito.

Como resultado das ações em prol do setor sucroenergético, iniciadas em Sertãozinho, o governo federal reagiu com o aumento da mistura do álcool anidro à gasolina de 25% para 27%, o que requer um aquecimento da atividade do setor. Também houve a volta da CIDE, taxa paga na compra de combustíveis, que proporciona mais competitividade do álcool. Anteriormente, a CIDE havia sido limitada pelo subsídio da Petrobras à gasolina. “O governo do Estado, um aliado do setor, que já tem um ICMS diferenciado para o álcool, também reagiu com medidas importantes. Dois decretos foram assinados neste mês, reduzindo o ICMS de alguns insumos de produção e diferindo o ICMS de produtos intermediários que circulam dentro das unidades, como bagaço e melaço. Todas estas medidas ajudam o setor a ter maior produtividade”, explica Zezinho.

Além disso, o prefeito revela que em março, em uma reunião de trabalho conjunto com a Secretaria de Estado de Energia e a de Agricultura, foi iniciado um programa de incentivo à cogeração de energia, com assessoramento técnico da empresa TGM, produtora de turbinas, que possibilitará uma demanda capaz de irrigar as indústrias de equipamentos, através de encomendas em médio prazo. Zezinho afirma que deverá ter a devolutiva das ações que estão sendo adotadas agora, em alguns meses, e que está ansioso por resultados positivos. “Uma crise sempre traz lições e é hora de aprender e refletir sobre a forma de passar por ela sem grandes danos. Para administrar uma cidade é preciso elencar prioridades e fazer escolhas, sempre. Todo administrador público deve ter consciência de o que está em pauta é o dinheiro público. Geri-lo é algo extremamente importante e uma responsabilidade muito grande”, conclui o prefeito.

Texto: Carla Mimessi
Fotos: Júlio Sian

 
 
 
 

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