O mercado de games

O mercado de games

Vinícius Melo e Eduardo Soares analisam as possibilidades que giram em torno do mercado dos games

Os jogos foram o lazer preferido na infância de muitas pessoas. Contudo, com os avanços da tecnologia, as brincadeiras de rua ou de tabuleiro migraram para os meios virtuais, possibilitando o uso com outros objetivos, além do entretenimento. O resultado dessa “substituição” foi o crescimento do universo dos games no Brasil e no mundo. O vídeo game não conquistou apenas jogadores, mas empresas que investem em produção e em marketing no universo digital. 

Segundo a pesquisa Game Brasil 2016, o Brasil é o quarto país no mundo em número de jogadores, ficando somente atrás dos Estados Unidos, da Rússia e da Alemanha. A expansão é tamanha que o ato de jogar está sendo profissionalizado, transformando jogadores em atletas e alguns desses se tornam profissionais milionários. Os famosos cybers atletas contam, ainda, com uma equipe técnica completa que dá suporte nos combates on-line. As redes sociais se transformaram em uma fonte de pesquisa intensa com inúmeros canais do YouTube e comunidades públicas e privadas que comentam, ensinam e apresentam novas possibilidades aos internautas. 

A pesquisa, que traça o perfil dos brasileiros que jogam video game, revelou que o crescimento dos games competitivos ainda é tímido, porém, vem conquistando público de todas as idades. No Brasil, 20 dos 100 maiores canais do YouTube são relacionados aos games. O país já foi sede de grandes competições relacionadas ao tema, como DotA 2, League of Legends e Counter-Strike: Global Offensive. 

Em consequência do aumento do mercado consumidor de games, há, também, o crescimento no número de empresas que desenvolvem esses produtos ou optaram pelos jogos para a divulgação das marcas. Cursos de graduação, técnicos e especialização foram criados para suprir a necessidade de profissionais que desejam investir no setor. Apesar de ser um mercado relativamente novo, os jogos on-line são um dos assuntos mais comentados entre o público jovem e adulto. Atentos ao universo digital, Eduardo Soares, jornalista, publicitário, professor e coordenador de pós-graduação em mídias digitais e Vinícius Melo, publicitário, professor e sócio-diretor da Rebellion, agência especializada em marketing digital e e-commerce, comentam na entrevista a seguir a expansão do mercado dos games. 


 
Eduardo: Sabemos que hoje participar ou não do mundo on-line não é uma opção. O acesso pelo mobile já ultrapassou o acesso pelo desktop. As empresas de jogos on-line estão de olho neste comportamento digital?

Vinícius: Estão. Recentemente, fiz uma pesquisa onde foi revelado que as pessoas passam muito tempo no celular por conta dos jogos e isso impulsionou o uso do celular para hábitos que eram comuns no desktop. O jogo é mais difícil em termos de usabilidade do que, por exemplo, acessar um site. As pessoas começam a usar outros recursos do aparelho devido ao tempo que passam jogando e isso demonstrou que elas podem fazer muitas atividades no mobile. 
 
Eduardo: Grandes empresas de jogo como a Sony abriram fábricas no Brasil pensando no comportamento da geração digital, isso, hoje, potencializa inclusive outros negócios?

Vinícius:
O mercado de jogos on-line é muito novo e isso não vale apenas para o Brasil. Quando vemos o League of Legends, um jogo virtual que tem cerca de 60 milhões de jogadores no mundo pensamos que é um número grande, entretanto, somos quase 8 bilhões de pessoas. Com essa visão, percebemos que o mercado ainda é muito pequeno, porém cresce de maneira avassaladora. Em quatro anos, vimos uma mudança grande em relação aos jogos on-line, tanto que virou profissão com os cybers atletas que despertaram o olhar de grandes marcas. O nosso país atrai inúmeros investidores e a economia atrapalha pouco. Não tem crise que atrapalhe esse mercado, pois existem muitos jogos e muitas pessoas interessadas em comprar e em jogar. A Sony investiu no país por isso. Uma marca de peso confiou no potencial do Brasil, o que estimula outras empresas a fazerem o mesmo. 
 
Eduardo: Lembro quando nos games, mesmo o Nintendo, o Playstation entre outros, havia anúncios de grandes marcas nos jogos, nos cenários de corridas e nos prédios. Agora isso se tornou secundário ou ainda é um caminho que pode ser explorado?

Vinícius: O mercado cresceu muito rápido nos últimos quatro, cinco anos e isso aconteceu devido às mudanças em relação à tecnologia e, principalmente, à infraestrutura. Afinal, é impossível jogar on-line se você não tiver uma internet boa.  Isso não quer dizer que o mercado era ruim, mas por uma questão lógica de velocidade e de tecnologia países como os Estados Unidos e o Japão, que são mais desenvolvidos, já contavam com uma gama maior de jogos. Esse atraso fez com que o mercado da publicidade que explora esse nicho também demorasse a se desenvolver. Em um exemplo prático, quando jogávamos um game de corrida as placas na lateral eram comercializadas. A grande diferença do ontem para hoje é que, antigamente, a marca dependia dos fabricantes, pois não tinha como inserir a publicidade no meio do jogo, então, ficava refém da mídia. Hoje, o cliente consegue  controlar essa mídia, consegue inserir a publicidade hoje e tirar amanhã, analisar o resultado, potencializar o investimento. O famoso pause e play da mídia on-line. 
 
Eduardo: Como os grandes influenciadores digitais, os youtubers e os bloggers podem ser um caminho para ações que potencializam os grandes jogos?

Vinícius: Esses influenciadores são muito importantes, muitas pessoas chegam ao mercado por conta deles. São fãs que potencializam os jogos. O youtuber, por exemplo, joga e ensina milhares de pessoas. Eles acabam difundindo e se tornam referência. Se eu tivesse uma marca, com certeza contrataria um digital Influencer para fazer parte da estratégia de marketing, pois ele pode impulsionar aquela ação que já está acontecendo com o game. Ele alcança um número grande dentro de um nicho específico, que não seria atingido de outra forma. 

Eduardo: O Pokemon Go virou uma febre mundial e chegou ao Brasil. A experiência da realidade aumentada começa a ser utilizada de forma criativa pelos jogos? Tínhamos aquela ideia, nos anos 80, de um capacete através do qual você entrava no jogo. Hoje, levar o jogo para fora da tela é um caminho promissor?

Vinícius: Muito e não só para os games, mas para as marcas. O McDonald’s, por exemplo, foi a primeira empresa a realizar uma ação com o Pokemon Go, antes do jogo ser lançado no Brasil. Assim fizeram outras marcas que, consequentemente, ajudaram a difundir o game. O Pokemon Go torna palpável algo que todo mundo queria fazer e não conseguia, ele alia a alta tecnologia, algo conhecido, e a competição. 

Eduardo: Hoje, já existe até a organização de grandes campeonatos presenciais de gamers, como a final do Campeonato Brasileiro do League of Lengends, disputado por muitos jovens no Ibirapuera, em São Paulo, que atraiu mais de 10 mil expectadores. Isso gira a economia e pode atrair muitos investidores?

Vinícius: É até engraçado porque o game, assim como o mundo digital, contribui para a mudança no comportamento das pessoas. Tem pessoas que jogam e pessoas que assistem aos jogos. O jogo on-line virou entretenimento e, sendo assim, também é negociável, pois não deixa de ser uma produção de conteúdo. Se tiver um número relevante de pessoas assistindo, conquista audiência e, se tem audiência, tem oportunidade para marcas explorarem comercialmente. Vira um negócio bilionário, gera emprego, economia e consumo. Resulta numa possibilidade aberta através dos jogos, independente se isso está acontecendo no mundo físico, on-line ou nos dois. Citando alguns exemplos, nos últimos dois anos, esses campeonatos profissionais encheram o Maracanãzinho, o Allianz Parque e o Ibirapuera. Teve transmissão ao vivo, com milhões de pessoas assistindo on-line. Agora, ao colocar na balança, no último campeonato realizado no Ibirapuera, por exemplo, a Sport TV viu que teria audiência e dedicou seis horas da programação para transmitir a final do League of Legends. Ou a emissora cria uma adaptação ao novo cenário ou futuramente perderá espectadores que poderiam consumir os produtos e que não praticam esportes, mas gostam dos jogos on-line.
 
Eduardo: Um em cada quatro brasileiros usa, em algum momento, um notebook, smartphone ou desktop para jogar. Hábitos que acontecem pela facilidade de conexão e pelo tempo de espera em filas, consultórios, ônibus e trânsito. Isso inspira, também, a criação de novos jogos?

Vinícius: Quando o assunto é games, geralmente, vêm em mente os jovens, mas muitos adultos gostam e costumam jogar. As redes sociais colocaram as pessoas on-line. Com isso, o público encontrou algo interessante e passou a ficar mais tempo on-line. Por serem democráticos, os jogos não atendem apenas o atleta, mas qualquer pessoa que queira jogar. Entretanto, vale ressaltar que com a mudança de comportamento, as pessoas passam muito tempo jogando ou navegando, deixando de fazer outras atividades. É importante manter o equilíbrio. É um novo mundo, com novos mapas, por isso tomem cuidado para não ficar alienados, o que é bom pode ficar ruim. 
 
Eduardo: As empresas se especializaram em monitorar comportamentos para poderem investir em ações estratégicas para marcas. É importante, antes de pensar em várias ações digitais diferentes, procurar especialistas para estudarem o mercado e entenderem o consumidor digital? 

Vinicius: Com certeza, pois o empresário pode investir em um lugar onde a informação corre muito rápida e se transformar em algo incoerente. Por exemplo, no atentado em Nice, na França, um anúncio de financiamento de caminhão foi veiculado em um jornal brasileiro de grande circulação na mesma página que noticiava o atentado. Alguns influencers acharam aquilo de mau gosto, disseminaram a opinião na rede e isso causou uma visibilidade ruim para a empresa, que não tinha culpa, pois não sabia que aconteceria essa vinculação. Todo cuidado é importante, independente da mídia. Quando falamos do mundo dos games, existem comunidades públicas e privadas onde são discutidos diversos temas e não temos o controle da propagação dessas publicações. Se a empresa fizer algo errado e isso circular em uma dessas comunidades, a marca corre o risco de não ter o retorno esperado. Ao decidir investir é necessário fazer uma pesquisa apurada. Se a empresa não souber ou não tiver equipe para fazer isso, contrate alguém que entenda e saiba monitorar. Aliás, mais que monitorar, porque até nessa questão a internet oferece inúmeras ferramentas fáceis de serem manuseadas. Um profissional pode fazer uma análise minuciosa da informação e ajudar a criar uma estratégia com as respostas que as ferramentas dão. Com isso, o investimento tem 99,9% de chance de ser certeiro. 
 
Eduardo: O gamefication ou a ideia de promover competição é algo que atrai público, como os aplicativos já existentes. O Swarm (parente próximo do Foursquare), por exemplo, ainda é pouco explorado. Este é um espaço livre onde empresas e marcas podem percorrer, como o próprio Waze. Por que essas ferramentas ainda são pouco exploradas? É a legislação que ainda restringe isso?

Vinícius: O mercado de games ainda é muito jovem, tem pouca mão de obra e a que existe, geralmente, é cara. Esse é um dos motivos para que as empresas ainda invistam pouco nos games. Por outro lado, as empresas que confiam na expansão do mundo on-line já colocaram em suas ações esse espaço. Porém, para investir é preciso ter uma ideia relevante, não criar por criar. Às vezes, a boa ideia não acontece porque a pessoa não entende como funciona o universo de desenvolvimento de um game. Se eu não entendo as possibilidades, não sei o que sugerir. 
 
Eduardo: É possível ganhar dinheiro com tudo isso?

Vinícius:
Claro. Esse é um mercado direcionado e que cresce dois, três dígitos, só que é um segmento muito difícil de trabalhar, que exige muito estudo, conhecimento, investimento e dedicação. Diferente de outros mercados, ele tem muito a crescer e, consequentemente, dá para ganhar muito dinheiro. Trata-se de uma opção cara que vai se tornando prioridade e acessível, à medida que isso se populariza. Quem estiver na frente, vai ganhar muito mercado. Em Ribeirão Preto, por exemplo, inaugurou, recentemente, uma escola de robótica e de programação. Também contamos com cursos de graduação de jogos digitais e pós-graduação na área. O fato é que existe um mercado movimentado. 


Além do online

“Conheci o Vinícius na época em que ele entrou na faculdade. Eu estava como professor em um grande evento da área de publicidade, em São Paulo, acompanhando os alunos. No segundo ano do curso, o Vinícius era o único participando, junto com Felipe Mendes, hoje seu sócio. Já sabia que ele teria uma carreira promissora. A atitude é o caminho certo para o sucesso. Hoje, somos parceiros em vários jobs e grandes eventos que fomentam a cultura do mercado de marketing digital no interior”. 
Eduardo Soares, jornalista, publicitário e coordenador de pós-graduação em mídias digitais. 

Compartilhar: