Bonfim Paulista: mar de casas
Atrativos identitários da vida rural são ainda muito marcantes no Centro Histórico de Bonfim Paulista

Bonfim Paulista: mar de casas

Com uma extensão de 177,355 km² — onde se concentram 95 condomínios —, o distrito de Bonfim Paulista vai muito além do que se imagina em área, história e possibilidades

Um pedaço de Ribeirão Preto lá dos primórdios da criação da cidade, meio que à parte, que acabou se integrando a uma região de grande expansão e valorização imobiliária: a Zona Sul. Assim é o distrito de Bonfim Paulista, onde antigo e atual se misturam criando um cenário único — de divisão econômica e cultural —, que o tempo e a história vão se encarregando de desenhar. 


Bonfim Paulista é o mais próximo que se pode chegar de sentir como tudo começou em Ribeirão Preto. Suas ruas estreitas, permeadas de construções modestas, quase sempre terminando em um matagal ou uma plantação — e mesmo a extensão da rua principal central, com muros de casas fazendo divisa com porteiras —, criam uma mistura de vizinhança urbana e rural que, instintivamente, remete ao passado, fazendo sentir a vivência de vila, ainda que, nas últimas décadas, um verdadeiro “mar” de empreendimentos imobiliários, bem ao estilo contemporâneo, de condomínios fechados de casas e de prédios, tenham se misturado à paisagem do distrito, meio que ‘isolando’ o centro.

 

Exemplo claro dessa dualidade vivenciada ali, as duas torres altas de edifícios, uma delas inacabada, do Residencial Asas do Sul, destoam na paisagem central do distrito, deixando visível, à distância, o antes e o agora na história de Bonfim Paulista. 


De modo geral, diferente de outras localidades, o centro do distrito ainda conserva sua identidade e referências culturais, mesmo tendo se passado mais de um século da sua fundação. Como relata um estudo feito por pesquisadores do Instituto Paulista de Cidades Criativas e Identidades Culturais (IPCCIC) compilado na obra “Paisagem Cultural do Café”, em 2013, como parte de um legado cultural, há edificações remanescentes que foram importantes centros de trocas comerciais, fabris e de prestação de serviços.

 

São construções resultantes de ofícios e modos de fazer de uma população que ainda guarda suas memórias por meio dos moradores mais antigos. Há bens culturais descaracterizados, porém, que continuam sendo importantes. Além disso, como parte do cotidiano da vila, até os dias de hoje há pessoas que residem em sítios, chácaras e fazendas das redondezas e se utilizam dos serviços básicos como escola, posto de saúde, oficina mecânica, funilaria, marcenaria, serralheiro, banco e comércio.

 

Aos finais de semana, há uma maior concentração da população rural, que usufrui do pequeno comércio em torno da praça central e de serviços e produtos como salão de barbeiro, farmácia, armazém de secos e molhados, supermercados de produtos em geral, açougue, quitanda, padarias, lojas de roupas, bares e restaurantes.


Para Adriana Silva, diretora do IPCCIC, o distrito tem atrativos identitários da vida rural ainda muito marcantes. “Fazendas em sua área, como a antiga Pau D’álho, guardam costumes e tradições do morador do campo. Muitos sítios com produção da agricultura familiar. Práticas religiosas, como a atuação de benzedeiras, realizações de terços e de novenas. Unidades patrimoniais significativas, como a antiga base da Força de Luz (CPFL), conjunto de imóveis da rua Professor Felizberto Almada, e referencial ambiental, com área propícia para a atividade de ecoesporte”, enfatiza.

 

Ainda segundo Adriana, a instalação dos condomínios tem levado o urbano e eliminado as referências rurais do distrito. “Não deveria ser uma contradição, mas a falta de um planejamento de longo prazo não permite ações de proteção e preservação. É necessário um plano de desenvolvimento para o local com vista a não ameaçar as belezas da antiga vila. Isso é possível sem ações totalmente proibitivas, mas com contrapartidas que beneficiam o próprio lugar. Mesmo para os chiques condomínios, quanto mais charmoso for o distrito com projetos de gastronomia, produção de atividades artísticas e preservação de alguns patrimônios arquitetônicos simbólicos, maior será o valor agregado para todos os envolvidos, inclusive com propostas de criação de trabalho e renda para os moradores do local”, ressalta.

 

Trechos da História 


Nascido no final do anos 1850, mas fundado, oficialmente, em 10 de fevereiro de 1894, e tornado distrito em 1902, Bonfim Paulista tem sua origem no final do século XIX, com o desmembramento de terras das fazendas Rio Pardo — que foi fundada em 1811, pelo português José Dias Campos e tinha, aproximadamente, 10 mil alqueires de extensão; e Retiro do Ribeirão Preto Acima, que tinha cerca de 4.600 alqueires e pertencia a Vicente José Dias e sua mulher Maria Silvéria da Anunciação que, após a morte do marido, vendeu as terras a José Borges da Costa Filho, que a dividiu em vários quinhões de terras, cabendo a Antônio Borges da Costa Sobrinho (falecido em 1864) e sua mulher Luíza Maria de Jesus (ou Oliveira) a posse das terras referentes ao Distrito de Bonfim Paulista. 


Atribui-se a origem do povoado a Francisco Rodrigues dos Santos Bonfim — um dos condôminos da Fazenda Retiro do Ribeirão Preto Acima —, por ter requerido a divisão judicial das terras, em 1891, e feito a doação de 10 mil m² de terra para a construção da Capela do Senhor Bom Jesus do Bonfim (fundada em 1894), e também de um alqueire para construção do cemitério e ½ alqueire para a construção da Estação Ferroviária.

 

 

 

Até 1885 conhecido por Viaduto ou Chave do Viaduto (uma denominação não oficial), em função da existência de um viaduto para a passagem de trem onde existia uma “chave” para abertura e movimentação dos encaixes dos trilhos, o povoado teve seu crescimento impulsionado pela chegada da Cia Mogiana de Estrada de Ferro e a criação da Estação de Villa Bonfim, levando, consequentemente, à criação, em 1895, do Distrito Policial; em 1897, do Distrito Municipal; em 1898, da Paróquia do Senhor Bom Jesus do Bonfim e em 1902, do Distrito de Paz.


O povoado servia de entreposto às grandes fazendas cafeeiras ao seu redor e foi, aos poucos, se urbanizando. A produção cafeeira saía da Estação de Villa Bonfim e seguia para o Porto de Santos em uma viagem de 10h, sempre em quatro horários diários. Em 1893, foi instalado o serviço de telégrafo. Em 1897, foram criados o Cemitério Municipal e o Serviço de Iluminação Pública à querosene. Em 1904, a rede de abastecimento de água. Foi assim que Bonfim cresceu e apareceu, mas não sem, antes, ver seu nome alterado de Villa Bomfim, em 1902, para Gaturamo, em 1944, até finalmente se tornar o Distrito de Bonfim Paulista, em 1953. 


Assim como a chegada da estrada de ferro Mogiana trouxe o desenvolvimento para Bonfim Paulista, sua partida prejudicou as atividades de comércio local — com a retificação no trecho Bento Quirino / Ribeirão Preto foram retirados os trilhos da Vila Bonfim. Isso, associado a construção da estrada de rodagem Anhanguera, distante da vila, mudou o curso da história do povoado, lançando Bonfim a uma espécie de ostracismo vivido até meados de 1970, quando, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o distrito voltou a apresentar crescimento da população urbana. 

 

Mercado Imobiliário


O mercado imobiliário de Bonfim Paulista e em seu entorno é altamente valorizado. Moradores relatam a dificuldade em encontrar imóvel para locação e brincam que o chão por ali “vale ouro”. No início dos anos 1990, o território do distrito vivenciou o começo da expansão de condomínios fechados de alto padrão, que hoje chega a 95 loteamentos/condomínios horizontais aprovados.

 

Distante 12 km de Ribeirão Preto, contando com uma área de 177,355 km², que engloba, inclusive, o Shopping Iguatemi, e uma população de 11.821 habitantes, segundo dados do Censo 2010 (IBGE), o distrito é estratégico do ponto de vista de comércio e serviços, tanto para moradores de bairros próximos mais antigos, como o Royal Park, da década de 1980, que tem, aproximadamente, 1.115.353,00 m² em suas 24 ruas, como para os mais novos, como Jardim Olhos D´Água e o Ilhas do Sul. 


Esta, aliás, é uma marcante característica histórica sua, já que, no passado, por volta da década de 1930, a então “Villa Bomfim” era considerada um importante centro urbano de abastecimento para a população rural das fazendas ao seu redor. Atualmente, veem-se maiores iniciativas no sentido de atender às demandas desta população dos condomínios às margens da Rodovia José Fregonezi, na via Dr. Luiz Carlos Bianchi — com instalação de posto de combustíveis, varejão, academia e escola, entre outros —, e na parte alta do distrito, próximo aos condomínios horizontais.

 


Para o especialista Frederico Oehlmeyer, a região deve permanecer sendo considerada um excelente investimento pela alta valorização do m² e por todas as melhorias que vem sendo realizadas, como revitalização de praças e canteiros, aprimoramento da rede de energia, novas opções de operadoras de telefonia, banda larga e TV à cabo, além da facilidade de acesso ao RibeirãoShopping e ao Iguatemi, pelo anel viário e pela rodovia José Fregonesi, que interliga o distrito a Ribeirão Preto e se estende até a rodovia Antônio Machado Santana, que leva a Araraquara. 


Entre as construtoras e incorporadoras presentes na região de Bonfim Paulista, Frederico destaca Bild; Pagano; Stéfani Nogueira; Pafil; Construcastro; Forti; WTB; Quali e Pedreschi, havendo público desde o cliente que procura pelo programa “Minha Casa Verde e Amarela” até o alto padrão.

 

“Conseguimos abranger vários perfis de clientes com a variedade de produtos de alta qualidade que a região proporciona. Há terrenos em condomínio com variação de R$ 2.000 a R$ 3.000,00 o m² — e de R$ 6.000,00 a R$ 11.000,00 o m² da construção. São vários empreendimentos em obra na região do Olhos D´Água, porque é um bairro novo, alguns com previsão de entrega a partir de 2024. Há, desde apartamentos de 1 dormitório, até 4 suítes, de 47m² a 298m². Os diferenciais são torres mais altas, infraestrutura completa de lazer, paisagismo e espaços montados por startups — como Bike Share (bicicleta compartilhada), lavanderia e academia —, que ficam responsáveis pela manutenção do local e alugam ao morador, por meio de aplicativo, quando ele deseja. Uma solução para baratear o custo do condomínio. Há, também, condomínios que usam aplicativo, sem custo, só para fazer reservas de espaço delivery; espaço Work; oficina, etc”, afirma Frederico. 

 

Memórias


No início do século XX, a então Villa Bomfim recebeu calçamento de paralelepípedos e um centro telefônico, inaugurado em 1906, na Praça Bonfim. Os moradores contavam com um farmacêutico, Joaquim Silva, que fazia os remédios e atendia aos moradores da cidade e do campo. Havia o Hotel Moré, fundado em 1903, e, em 1915, surgiram pensões como a Espanhola e a São José.

 

O senhor Severo Ferreira transportava as compras que os colonos faziam na cidade para as fazendas e buscava, em Ribeirão Preto, os artigos inexistentes na vila. Haviam as fábricas de macarrão, de carroção, de sabão e de foguetes, além da Gráfica Dinamérico. O cinema de Joaquim Silva, fundado em 1904, iluminado por lampiões e tocado por caldeira à vapor, com lenhas na fornalha, era opção de lazer. Em 1925, surgiu o Bonfinense Futebol Clube, onde Orozimbo, Arassindo e Agemiro fizeram sucesso, sendo convidados, depois, para jogar no Botafogo Futebol Clube, de Ribeirão Preto.

 

Linha do tempo

 

1895
Criado o Distrito Policial de Villa Bonfim, pertencente ao município de Ribeirão Preto.

 

1897
Em 18 de janeiro, o Intendente Municipal Joaquim Estanislau da Silva Gusmão assinou a Lei n. 22, promulgando a deliberação da Câmara Municipal (de 28 de dezembro de 1896), transformando a Villa Bonfim em Distrito Municipal. Esta lei também definiu o território do Distrito, fixando o lançamento do imposto predial, o estabelecimento do serviço de Iluminação Pública e a criação do Cemitério Municipal.

 

1902
Através da Lei n. 840, de 03 de outubro, é criado o Distrito de Paz de Villa Bonfim.

 

1938
Em 30 de dezembro, através do Ato n. 28, assinado pelo Prefeito Municipal Fábio de Sá Barreto, é definido o perímetro urbano de Villa Bonfim e seu território, para fins jurídicos e tributários.

Através do Decreto Estadual n. 9775, de 30 de novembro, a Villa Bonfim passa a denominar-se Bonfim.


1944 
Através do Decreto-Lei Estadual n. 14334, de 30 de dezembro, o Distrito de Bomfim (grafia da época) passa a ser denominado Gaturamo (ave de plumagem colorida).

 

1953
O Distrito de Gaturamo passa a denominar-se Bonfim Paulista.

 

 

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Foto: Revide

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