Empreender com equilíbrio

Empreender com equilíbrio

Anderson Criativo, um dos fundadores do Onovolab, conta um pouco sobre a sua inspiradora história de vida

Você só sobe de nível a partir do momento que muda algo em você”. Essas são as palavras de Anderson Criativo, CEO do Onovolab, o maior hub de inovação independente do Brasil. Junto do sócio Leandro Palmieri, Criativo fundou o centro em 2018, na cidade de São Carlos, interior de São Paulo, em uma fábrica ‘abandonada’.

 

Quatro anos depois, a sede cresceu. É ocupada por residentes importantes, como Santander e IFood. Gerou mais de mil empregos e impactou a cidade São-carlense em R$ 100 milhões. Em novembro de 2021, o Onovolab começou a se expandir e, em menos de um ano, conta com braços em Ribeirão Preto, Indaiatuba e Araraquara, todas no interior de São Paulo, e uma em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Gente como a gente, Anderson Criativo tem uma história inspiradora e que traduz muito esforço e dedicação. Confira:

 

Poderia compartilhar um pouco da sua trajetória profissional até aqui?

 

Comecei a empreender em 1999. Faz bastante tempo já, mais de 20 anos. Era uma coisa natural. Eu sempre quis empreender, nunca imaginei outra coisa. No começo, não foi fácil, pois empreender no Brasil é muito difícil. Você não conta com nenhum apoio e precisa fazer na marra. Então, ao longo dos anos, fui mudando. Fiz várias coisas e fui, de fato, aprendendo enquanto fazia. Depois, conheci meu sócio atual, Leandro, em 2009.

 

Criamos um negócio muito específico: uma agência de comunicação especializada em empresas de tecnologia em São Paulo. Percebemos que era um nicho que não existia e atendemos empresas grandes de comunicação para a tecnologia. Em paralelo a isso, começamos a promover eventos dessa área em São Paulo, gratuitos. É um negócio curioso, pois nem sabemos o real motivo para darmos início a essas atividades, mas organizávamos, pois, achávamos que era preciso. Na época, estavam começando as redes sociais. Ainda havia muito ceticismo, do tipo ‘será que elas vão ser grandes ou isso é só moda?’. E a gente batia na tecla que não, isso vai ser muito grande, vai transformar a mídia e a sociedade. Todo mundo duvidava. 

 

E quando foi que esse cenário mudou?

Para nós, foi quando começamos a organizar um evento em São Paulo chamado Social Media Day, que foi ficando cada vez maior. Foi legal que a gente não fazia os eventos para ganhar dinheiro, mas, sim, porque gostávamos de organizar e achávamos que os assuntos mereciam ser discutidos.

 

Uma hora essas coisas foram se juntando na nossa cabeça e a gente acabou pegando o começo do movimento de startups no Brasil. Aí, passamos a criar eventos de startups até que chegou a um ponto que a entendemos que não éramos comunicadores e nem organizadores de eventos. Queríamos ter um outro papel, mas a gente não sabia exatamente qual.

 

Pensamos e pensamos, até que surgiu essa ideia de criar um ambiente físico para reunirmos essas pessoas. Foi aí que demos início ao desenvolvimento do Onovolab. Mas, minha trajetória inteira como empreendedor foi muito desgastante, pois você tem a ideia, bota na cabeça que quer fazer aquilo, mas não tem o mínimo de recursos para fazer. Então, o processo é desgastante mesmo.

 

Agora uma curiosidade, seu nome é Anderson Criativo mesmo?

 

Não, o Anderson Criativo surgiu quando fui criar meu Twitter, em 2008. Quando fui criar a conta, coloquei meu nome, mas já tinham pego esse usuário. Então, pensei assim: o que vou colocar? Peguei o Criativo e vi que estava disponível, mas não era nem meu apelido, nada do tipo. Era só um nickname qualquer. Foi engraçado que na época, como a gente fazia esses eventos de redes sociais, as pessoas me encontravam fisicamente e perguntavam: ‘você que é o Criativo’”. Aí adotei esse nome, há mais de dez anos, e virou meu Alter Ego. 

 

Como foi se mudar de São Paulo para o interior?

 

A mudança foi mais fácil por conta do momento da vida. Como eu estava com dois bebês na época, o fato de ter saído de São Paulo foi muito oportuno, pois conseguir criar os filhos no interior, em um quintal de casa e sem violência, foi a oportunidade de oferecer mais qualidade de vida para a minha família, o que na capital seria difícil.

 

São Paulo não é uma cidade para criança. Nesse aspecto, foi muito bom mudar para o interior. Me trouxe uma perspectiva diferente, porque, apesar de ser de Santos, minha carreira toda eu fiz na capital. Minha referência de trabalho sempre foi em São Paulo. Quando comecei a executar o trabalho em uma cidade menor, consegui sentir o efeito do meu trabalho com mais evidência, sabe? Então, em São Paulo a gente fazia tudo isso que eu comentei de eventos, mas era só mais um em meio a outros.

 

No interior, não. Além de todas as outras coisas que conseguimos enxergar melhor no interior, como perceber que uma pessoa está empregada graças ao nosso trabalho. Essa sensação é muito, muito legal. Mas o que eu sinto falta de São Paulo é a questão da cultura e da arte. Vejo que no interior, a cultura e arte têm muito que se desenvolver ainda. Esse é o contraponto.

 

Quais foram as motivações que impulsionaram nessa mudança?

No meu caso específico, foi uma oportunidade. Isso é engraçado, pois nunca, nunca imaginei morar no interior. Foi uma oportunidade. Queria executar um projeto em São Paulo, mas era inviável, porque não tinha dinheiro. Aí eu fui para São Carlos fazer uma visita. Me deu um estalo de que, talvez, o projeto pudesse acontecer no interior.

 

Depois eu volto mais uma segunda vez para São Carlos e visitei a fábrica abandonada. Na terceira visita, eu convenci o dono da fábrica a alugar ela para gente, sem garantia. Falei para ele que o nosso nome estava sujo e que não conseguia dar nenhuma garantia. Ele confiou e, hoje, é o nosso sócio. Nos mudamos por conta dos talentos da cidade e pelo espaço.

 


Anderson Criativo saiu de São Paulo para fundar o Onovolab, em São Carlos; projeto chegou recentemente em Ribeirão Preto

 

No início, quais foram os obstáculos e as dificuldades que você enfrentou?

 

Foi muito desgastante. A ponto de trocarmos o sabão em pó entre as esposas, comprar fralda barata para os filhos, ficar oito horas esperando em um posto de saúde e colocar nossos filhos em escolas públicas. No começo, foi restrição total.

 

Eu fiquei lá quase um ano e meio sem visitar meus pais em Santos, porque não tinha dinheiro para colocar combustível para sair de São Carlos. A gente ficou ilhado por quase um ano e meio, pois não tínhamos grana. Conforme o Onovolab começou a crescer, conseguimos mudar um pouco essa situação, mas no começo foi bem difícil.

 

Depois de todas essas dificuldades, como é se ver agora?

 

É um misto, sabe? É engraçado. Eu poderia fazer um discurso muito mais bonito, mas é um misto de duas coisas. Por um lado, a gente tem esse sentimento de orgulho pelo que fez, não é? Então, você fala, pô, olha o preço que a gente pagou para construir um negócio que não é só para gente, é para a comunidade, para as pessoas mesmo, para a cidade.

 

Então, você fica orgulhoso por uma ideia que a gente teve construída na unha. Hoje, ela gera mil empregos e tem um potencial econômico. Então, fico feliz e orgulhoso. Por outro lado, o que a gente sente é que, no Brasil, você tem que sempre estar se provando. Apesar de você ter feito tudo isso, quando vou conversar com uma empresa, mesmo sabendo tudo o que a gente já fez, ainda ficam algumas dúvidas. Por isso, ao mesmo tempo que tenho orgulho, é um pouco frustrante.

 


De onde surgiu essa ideia de começar a expansão para outras cidades?  

 

A ideia surgiu em novembro do ano passado, que foi quando a gente percebeu que a pandemia já estava em declínio. Durante esse período, dobramos de tamanho. E aí ficou todo mundo surpreso: como é que os caras conseguiram dobrar de tamanho físico durante a pandemia e trazer gente, não é? É, mas pelo mesmo motivo que a gente criou o Onovolab lá atrás, é que a gente continuou trabalhando.

 

Entendemos que poderia haver um meio termo entre o isolamento total e fingir que não estava acontecendo nada. Encontramos esse meio termo. Em um certo momento, paramos, analisamos e pensamos como seria bom reproduzir esse impacto em outras cidades, com essa quantidade de empregos e todos os outros benefícios. No final, percebemos que não foi uma decisão de negócios, mas, sim, uma decisão para impactar outros lugares também.

 

 


Como é ser o CEO do Onovolab?

 

Também é um misto de duas coisas. Por um lado, tomar decisões não é legal, porque é um negócio delicado. Qualquer decisão que eu tome hoje, ela vai impactar a vida de muita gente. Hoje, represento o Onovolab e uma comunidade de milhares de pessoas. Então, às vezes, a minha opinião pessoal pode impactar tudo isso que foi construído por conta do meu ego, sabe? Ao longo do tempo, você vai percebendo que uma decisão errada que eu tome, pode impactar a vida de muitas pessoas.

 

Também tem a ver com esse período da vida, conforme você vai amadurecendo, vai entendendo que a influência também tem relação com níveis. O negócio vai expandindo e a influência vai aumentando. Se nesse momento você não tiver maturidade, as coisas acabam saindo do controle e você acaba usando isso de uma forma não muito legal. Por isso que eu e o Leandro, que é meu sócio, desde o começo, temos esse pé no chão.

 

A gente acha legal algumas coisas do tipo, é legal você ter reconhecimento, é legal você conversar com pessoas que você não imaginou que iria conversar. Você dá entrevista, você está no palco. Alguns momentos são legais, mas, ao mesmo tempo, a gente tem um pé no chão. Tudo isso é muito frágil, então, hoje, você pode ser um cara mais visionário e incrível do mundo, mas, amanhã, pode não ser mais nada disso. É preciso usar tudo isso de forma moderada, com maturidade e com muita inteligência. 

 

 

Como o seu negócio transformou a sua vida?

 

Olha, eu acho que a maior transformação foi nesse sentido de entender que assim, quando você é empreendedor, você quer criar um grande negócio, não é? Hoje, eu tenho um negócio que eu considero relevante. Isso é bem gratificante.

 

E quando eu olho, o principal aspecto que vejo é o quanto que o empreendedorismo transforma. Ninguém quer passar por dificuldades. Você quer os momentos bons, não é? Mas a dificuldade, ao mesmo tempo que ela te aborrece, te desgasta, abala o psicológico, às vezes, até mesmo, a saúde, ela te molda. Te fornece bagagem para vida e vai te dando um pouco mais de empatia.

 

 

E quais são os próximos passos?

 

 Eu gosto tanto do que eu faço hoje que percebo que é muito difícil me ver fazendo outra coisa. Cheguei num ponto de fazer algo que eu gosto. É o meu dia a dia. Convivo com pessoas que vivem a mesma coisa que eu vivo. Naturalmente, o empreendedor é ambicioso, não é? A gente quer mais, mas, ao mesmo tempo, acho que os meus próximos passos estão muito mais ligados ao equilíbrio. Durante muito tempo, você quer mais, mais, mais, mais, mais.

 

Aí depois você chega num certo ponto de maturidade que você entende que poucas coisas são realmente valiosas. E aí eu vejo que os meus próximos passos estão muito nesse sentido: eu quero é investir mais tempo, ter mais tempo e fazer mais dessas coisas que eu acho que são as poucas coisas muito valiosas. É gastar pouco tempo com coisas que eu acho que não são valiosas. Estou mais em um processo de maturidade do que de empolgação, sabe? É a primeira vez que estou sentindo isso na vida. 


Fotos: Susanna Nazar

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