Perigos da automedicação

Perigos da automedicação

Quase 90% dos brasileiros admite já ter se automedicado; apesar de comum, essa prática pode acarretar sérios problemas de saúde

Atire a primeira pedra quem não tem remédios em casa. De comprimidos para dor de cabeça, até remédios que sobraram de tratamentos mais sérios. Alguns, até fora do prazo de validade. Apesar de comum, a automedicação já pode ser encarada como um problema de saúde pública no país. Uma pesquisa do Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico (ICTQ), feita em 2022, revelou que 89% das pessoas se automedicam no Brasil.

 

Em 2014, o número era 76%. De acordo com o Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox/Fiocruz), anualmente são registrados cerca de 30 mil casos de internação por intoxicação medicamentosa, com cerca de 20 mil mortes no país. Ainda de acordo com a pesquisa do ICTQ, os analgésicos estão no topo da lista, com 64%, seguidos dos antigripais (47%) e relaxantes musculares (35%). 


Uma pesquisa do Conselho Federal de Farmácia de 2019 identificou, ainda, uma modalidade diferente de automedicação, a partir de medicamentos prescritos. Nesse caso, a pessoa passa pelo profissional da saúde, tem um diagnóstico, recebe uma receita, mas não usa o medicamento conforme orientado, alterando a dose receitada. Esse comportamento foi relatado pela maioria dos entrevistados (57%), especialmente homens (60%) e jovens de 16 a 24 anos (69%). A principal alteração na posologia foi a redução da dose de pelo menos um dos medicamentos prescritos (37%) pelos motivos de considerar a doença já controlada, o medicamento ter efeitos colaterais ou ser muito caro. 

 

Medicamentos mais consumidos por conta própria no Brasil


Fonte e arte: ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o mercado farmacêutico.


Para Tufik José Magalhães Geleilete, médico nefrologista e clínico geral, outro equívoco comum é acreditar que doses maiores aliviam mais rápido os sintomas. “Doses acima do recomendado podem causar efeitos colaterais indesejados e até mesmo intoxicações graves”, explica. Outro equívoco é utilizar medicamentos prescritos para amigos ou familiares. “Cada pessoa possui condições individuais de saúde e, o medicamento que funciona para uma pode não funcionar para outra, e até causar mal”, acrescenta. 


A cultura da automedicação no país é reforçada pela propaganda medicamentosa. “Muitas vezes se mostram os sintomas e a medicação como uma grande solução direcionando, por vezes, ao diagnóstico incorreto”, explica Wilson Pico, especialista em clínica médica. 


Para piorar, automedicação pode mascarar sintomas de condições médicas potencialmente graves, devido ao alívio temporário dos sintomas. “Muitos medicamentos de venda livre tratam apenas os sintomas, enquanto a verdadeira causa do problema se agrava. Pense em alguém que atrasa o diagnóstico de um câncer de estômago por tomar omeprazol imaginado se tratar de uma gastrite, ou deixa um refluxo gastroesofágico evoluir até aparecerem complicações, como pneumonias e outras lesões pulmonares”, alerta Geleilete.


Doutor Internet


Segundo o ICTQ, 40% dos brasileiros fazem o autodiagnóstico pela internet, desses, 63% possuem ensino superior. A disponibilidade das informações na internet é benéfica, segundo Wilson Pico, desde que seja de boa qualidade, mas falta um filtro dessas informações. “Além disso, casos que antes eram compartilhados entre familiares e pessoas conhecidas, tomam uma proporção muito maior com a internet, estimulando o autodiagnostico.

 

Ao invés de propagar que utilizou determinado medicamento e funcionou, a pessoa deveria direcionar para o profissional que fez o diagnóstico preciso”, pontua. A saída:  educação. “A população precisa ser educada sobre os riscos da automedicação e a importância de buscar orientação médica adequada. Profissionais de saúde, a sociedade e a mídia precisam se envolver nisso”, conclui.  


Foto destaque: Freepik

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