Justiça derruba decreto que liberou reabertura de serviços em Ribeirão Preto

Justiça derruba decreto que liberou reabertura de serviços em Ribeirão Preto

Estabelecimentos como salões de beleza, autorizados a abrirem nesta terça-feira, 28, deverão fechar as portas novamente

A juíza Lucilene Aparecida Canella de Melo, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Ribeirão Preto, acatou parcialmente um pedido de tutela de urgência protocolado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, solicitando a derrubada de dois decretos, publicados na segunda-feira, 27, pela Prefeitura, flexibilizando a abertura do comércio na cidade. O pedido da promotoria foi ajuizado na manhã desta terça-feira, 28, e a decisão foi publicada às 19h56.

Com a decisão, foi derrubado o decreto nº 100/2020 e mantido o decreto 101/2020. Ou seja, os estabelecimentos incluídos na lista de essenciais na última segunda-feira, 27, e com autorização para reabrirem hoje, deverão fechar as portas novamente. Isso incluí as clínicas de estética, clínicas de podologia, barbeiros, cabeleireiros e clínicas odontológicas. Os serviços previstos para voltarem a partir do dia 11 de maio ficam mantidos para a mesma data.

Em nota, Prefeitura de Ribeirão Preto disse que, diante da decisão judicial, a partir de agora, "deve seguir integralmente as medidas de quarentena estabelecidas em decreto do Governo do Estado de São Paulo."

De acordo com o promotor Sebastião Silveira, autor da ação, o prefeito Duarte Nogueira (PSDB) não ignorou apenas as determinações estaduais que tratam do isolamento social, mas também recomendação do próprio Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) e o parecer de profissionais da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, que apontavam a necessidade de manutenção das medidas restritivas adotadas em virtude da disseminação da Covid-19. 

Na decisão, Lucilene cita o estudo realizado pela USP que afirma que o pico da pandemia ainda não atingiu Ribeirão Preto, segundo a magistrada, "muito provavelmente por conta dos resultados positivos do isolamento social imposto pelo Decreto de Calamidade Pública".

Ainda citando o estudo, a juíza declara que o município está, provavelmente, cerca de duas a três semanas atrás do nível da epidemia registrada na cidade de São Paulo. "O que torna prudente a manutenção do distanciamento social ampliado enquanto se aprofunda a discussão de estratégia segura de liberação progressiva", escreveu.

A juíza argumenta que, segundo a Constituição Federal, compete à União, Estados e Distrito Federal legislar sobre proteção e defesa da saúde; autorizando também os municípios. Ela explica que a possibilidade de suplementar a legislação federal e estadual deve ocorrer "desde que haja interesse local".

A averiguação do “interesse local” só se torna possível mediante a investigação de todos elementos que envolvem o caso concreto Segundo ela, os dados apresentados pelas pequisas mais recentes, tornam questionável a existência de interesse local para o abrandamento das medidas restritivas.

Segundo o promotor, o prefeito de Ribeirão Preto "age de forma arbitrária, se arvorando no poder decidir o destino de um povo, inclusive rumo a um desastre anunciado, com o sacrifício da saúde e vida de muitas pessoas". 

E acrescenta: "Não bastasse o risco para as pessoas, o precário sistema médico-hospitalar da cidade também é colocado em grande risco, tendo em vista que qualquer aceleração na curva de novos casos pode levar ao completo esgotamento dos recursos existentes.

Estudo da USP

Dirigentes e profissionais de saúde, vinculados à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (HCFMRP) e da Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Assistência do HCFMRP (FAEPA) elaboraram um documento com o objetivo de contribuir na análise do impacto da pandemia e das ações de controle na região. 

No texto, divulgado no último dia 20 de abril, os profissionais apresentam os dados científicos que se têm, até o momento, sobre o novo coronavírus e, com base nesses achados, quais são os possíveis cenários futuros. Ao todo, são 16 especialistas do alto escalão da Saúde na USP.

Segundo os pesquisadores, as evidências científicas demonstram o impacto positivo do distanciamento social sobre a transmissão do vírus e sobre a adequação da capacidade do sistema de Saúde na cidade.

Apesar disso, eles ainda não descartam uma possível elevação no número de infectados na cidade caso as medidas de isolamento sejam abandonadas. Eles são enfáticos que o cenário seria muito pior sem o isolamento.

Os pesquisadores avaliam que, independentemente das medidas que sejam tomadas, haverá impactos na economia. A profundidade e a duração da crise dependerá de quais medidas serão tomadas. Não obstante, eles concordam que manter as pessoas vivas e isoladas é melhor do que ver o número de mortos subir. 

"Nenhuma economia sobreviveria com seus cidadãos sendo infectados, adoecendo, e se sentido ameaçados de não terem acesso ao atendimento hospitalar ou cuidados de terapia intensiva na medida em que a pandemia avança. Neste contexto, o distanciamento social ampliado é imperativo e até onde percebemos, nesta pandemia da Covid-19, a única alternativa a ser adotada"

Por isso, eles propõe, uma evolução da fase atual, chamada de Distanciamento Social Ampliado, para a de Distanciamento Social Seletivo, que devem ser adaptadas para cada região e ser pautadas pelas recomendações da Organização Mundial de Saúde. 

Todavia, para que isso ocorra, é necessário um estudo em conjunto da situação da epidemia na cidade, além de uma comprovação por meio de testes de que os casos de covid-19 atingiram um patamar "seguro". Todos esses fatores só serão alcançados, segundo os pesquisadores, por meio do isolamento social.

O que diz a Prefeitura de Ribeirão Preto

Por meio de nota, a prefeitura informou que as adequações às medidas de quarentena publicadas no Decreto nº 100, de 28 de abril de 2020, foram amparadas em deliberações do Comitê Técnico de Contingenciamento da Covid-19 e do Grupo de Transição e Retomada Pós-Covid, considerando, ainda, as deliberações externadas pelo Comitê Administrativo Extraordinário Estadual Covid-19, bem como os Boletins Epidemiológicos de autoria da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.

"De fato, segundo dados fornecidos pela Secretaria Municipal da Saúde, a curva de casos para Covid-19, em Ribeirão Preto, tem permanecido estável. O boletim Epidemiológico desta quarta-feira, 28, apresenta 270 casos confirmados e sete óbitos, ou seja, uma morte para cada 100 mil habitantes, indicando taxa de letalidade de 2,7%", diz a nota.

Ainda segundo a nota, a adequação para abertura de alguns estabelecimentos específicos, prevista no decreto nº 100, esteve condicionada à adoção de rígidas medidas sanitárias, para evitar a propagação da doença, tais como o uso de máscaras, observância de uma pessoa para cada 10 metros quadrados de área de atendimento e  distanciamento de dois metros entre as pessoas. "No caso dos salões de cabeleireiros e similares, somente foi autorizado o atendimento com hora marcada, sem espera e com total assepsia do local entre os clientes." 
Porém, a prefeitura disse que, diante da decisão judicial que deferiu a liminar requerida pelo Ministério Público, a partir de agora, deve seguir integralmente as medidas de quarentena estabelecidas em decreto do Governo do Estado de São Paulo.

Mesmo vale para a região

Nas cidades de Sertãozinho e Cravinhos, o MPSP também ajuizou ações civis públicas contra medidas adotadas pelas prefeituras para flexibilizar a quarentena, prevista para durar até 10 de maio, conforme decreto do governo do Estado. Segundo a promotoria, além de atentarem contra a saúde pública, as medidas poderiam sobrecarregar o sistema de saúde de Ribeirão Preto.

Ambas as ações foram aceitas pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), que tem seguido uma tendência de obrigar os municípios a cumprirem as diretrizes estaduais de combate ao coronavírus. Medidas semelhantes já foram tomadas também em São José dos Campos e Diadema.

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Imagem: Revide

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