Prefeitura utiliza parte de repasse Federal para cobrir déficit na previdência de Ribeirão
Parcela dos recursos que são destinados ao combate à Covid-19 podem ser utilizados para resolver problemas financeiros causados pela pandemia
A Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto empenhou parte de um repasse do Governo Federal para o enfrentamento à crise causada pela pandemia do novo coronavírus para cobrir déficit no Instituto de Previdência dos Municipiários (IPM). A informação está disponível no Portal da Transparência e foi confirmada pelo Governo Municipal. Um inquérito civil foi instaurado nesta terça-feira, 14, para apuração das transferências de recursos da Prefeitura para o IPM
Segundo notas de despesa disponíveis no Portal da Transparência, o Executivo espera destinar R$ 12,4 milhões para cobrir o déficit da previdência no município. Ainda segundo consta na nota de despesa, a verba é proveniente de um repasse feito via lei 173/2020, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), no dia 27 de maio.
A lei prevê o repasse a estados e municípios para o enfrentamento da crise causada pela pandemia do novo coronavírus. O Portal Revide questionou o Ministério da Economia se a utilização da verba para outros fins é possível.
Em nota, a pasta informou que a lei 173/2020 estabelece que parte dos recursos transferidos para estados e municípios (R$ 10 bilhões) seja destinada a ações de saúde e assistência social e o restante (R$ 50 bilhões) pode ser aplicado de forma discricionária por esses entes em ações de enfrentamento à Covid-19 e na mitigação de seus efeitos financeiros.
Mensalmente, o Tesouro Nacional divulga em formato aberto os valores transferidos aos estados e municípios relativos ao auxílio financeiro de que trata a Lei 173/2020. Nesses arquivos, é possível verificar quanto cada estado e município recebe e quanto do valor transferido deve ser aplicado obrigatoriamente nas ações de saúde e assistência social e qual o montante de recursos livres.
De acordo com os valores divulgados pelo Tesouro, para Ribeirão Preto, referentes a junho, serão repassados R$ 2,5 milhões de recursos para assistência social diretamente ligados à pandemia e R$ 17,1 milhões de recursos livres para mitigar os impactos da crise.
Prefeitura
Sobre o repasse ao IPM, a Prefeitura confirmou que houve a transação. "Se trata de repasse de recurso Federal ao Instituto Previdenciário Municipal (IPM) para o pagamento de custeio, devido à queda na arrecadação do município em virtude da pandemia. Informamos ainda que, a destinação está em conformidade a Lei Complementar 173/2020 que instituiu o Programa Federativo de Enfrentamento à Covid-19, porém com destinação específica, conforme prevê a lei, para compensação de perdas pela queda de arrecadação dos estados e municípios com a pandemia do Covid-19", declarou.
Em nota, a Prefeitura ainda informou que, até o momento, recebeu R$ 10,5 milhões de recursos federais liberados via lei 173/2020 e informa que esses recursos foram utilizados para os seguintes fins:
- Firmar convênio com o Hospital Municipal Francisco de Assis, que passou a dar suporte ao atendimento público de saúde por meio da disponibilização de 31 novos leitos para pacientes não Covid-19, como retaguarda aos demais hospitais públicos;
- Aquisição de materiais de consumo;
- Pagamento da folha de vencimentos dos plantonistas que atuam na linha de frente ao combate da Covid- 19;
- Investimentos para o funcionamento do Polo Covid (UPA da Avenida Treze de Maio);
O Executivo também informa que foram feitos investimentos, com esta verba federal, aliado às doações da Justiça Federal e Justiça Estadual, a instalação do laboratório para realização de exames RT-PCR no Fipase / Supera Parque.
Inquérito instaurado
Advogados consultados pela reportagem informaram que o município não estaria avançando sobre a determinação do Governo Federal ao separar o dinheiro "carimbado", ou seja, que só pode ter uma finalidade, em dois grupos: um que tem o uso obrigatório em assistência social voltada à Covid-19 e o outro para conter a crise.
Contudo, o déficit do IPM não tem ligação direta com a crise causada pela pandemia, sendo um problema conhecido pela administração municipal anteriormente Além disso, o entendimento do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) foi outro. A promotoria do Patrimônio Público de Ribeirão Preto informou que instaurou inquérito civil nesta terça-feira, 14, para apuração das transferências de recursos da Prefeitura para o IPM.
Informam que os fatos noticiados "aparentam irregularidade, já que implicaram em transferência de recursos vinculados ao combate à pandemia para fim diverso, com possível afronta ao disposto no artigo 167, inciso IV da Constituição Federal" – que veda a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro –, "além dos artigos 71-74 da Lei no. 4320/64", que trata de fundos especiais e a aplicação de receita destes.
Além da requisição de informações foi determinada a remessa de cópias ao Tribunal de Contas e Procuradoria Geral de Justiça, para as providências de alçada de tais órgãos, informou o promotor Sebastião Sérgio da Silveira.
Repercussão
Em Brasília o deputado federal Ricardo Silva (PSB) também criticou os repasses. "Esse parlamentar fez um ofício para o Tribunal de Contas da União denunciando que o dinheiro que essa casa aprovou para estados e municípios, lamentavelmente está sendo usado para pagar o rombo no instituto de previdência". Na tribuna da Câmara, o deputado também declarou que notificou a Polícia Federal sobre o tema.
O ofício ao TCU foi protocolado na segunda-feira, 13, e à PF foi na terça-feira, 14. "Como o TCU se manifesta sobre essa ação da Prefeitura de Ribeirão Preto, que tirou da população R$ 12.453.930,46 para cobrir um déficit financeiro de um órgão de previdência próprio?", foi uma das perguntas encaminhadas pelo parlamentar ao Tribunal.
Leia mais:
Prefeitura de Ribeirão Preto retira projeto de reforma da previdência municipal
Foto: Acervo Revide