Formatura sem golpe
Após uma aluna da USP de São Paulo ser acusada de desviar quase R$ 1 milhão da conta da comissão, especialistas ensinam como organizar a festa de formatura dos sonhos sem riscos
Uma estudante de Medicina da USP de São Paulo é acusada de ter desviado cerca de R$ 937 mil da conta da comissão de formatura de sua turma. Segundo a Polícia Civil, Alicia Dudy Muller, de 25 anos, teria usado o dinheiro para fins pessoais, como apostas em casa lotérica, investimentos, aluguel de imóvel, veículo e até com eletrônicos. Ela foi indiciada pela polícia pelo crime de apropriação indébita, mas o Ministério Público de São Paulo (MPSP) entende que a suspeita teria cometido estelionato.
O escândalo do golpe tomou proporções nacionais e a empresa Ás Formaturas, contratada para organizar a comemoração, informou ao Procon de São Paulo que vai bancar o valor desviado para garantir o baile da turma prejudicada pelo desfalque milionário. O golpe acendeu o sinal de alerta em estudantes do país. Afinal, organizar uma festa de formatura demanda tempo, dinheiro e, principalmente, mexe com os sonhos dos alunos. Para garantir a festa, é preciso ter uma série de cuidados.
De acordo com o advogado Gabriel Augusto Ferroni Cardoso, tudo começa pela escolha dos membros da comissão de formatura. “Deve-se escolher entre os alunos mais interessados, aqueles mais confiáveis. Deve-se conhecer, antes da escolha, a vida pregressa de cada um dos membros, principalmente em relação à pessoa que vai desempenhar a administração do dinheiro”, orienta.
O advogado Gabriel Augusto Ferroni Cardoso afirma que é importante a elaboração de um estatuto da comissão de formatura
Ele afirma que também é importante a elaboração de um estatuto da comissão de formatura, que é um documento formal que disciplina regras jurídicas, define direitos e deveres, delimita funções e regula condutas. “No estatuto poderá, por exemplo, limitar a movimentação de valores exigindo-se a anuência de mais dois membros da comissão”, aconselha. Além disso, é interessante, em caso de contratação de uma empresa responsável pela promoção da formatura, que todos os valores destinados à celebração sejam transferidos diretamente para a companhia.
“Neste caso, é indispensável a elaboração de um contrato que, assim como no estatuto, regula a relação entre a empresa, a comissão e os alunos. E, em caso de quebra de contrato, é mais fácil conseguir a responsabilização de uma pessoa jurídica em vez de uma pessoa física”, ensina o advogado. Segundo ele, golpes como o que aconteceu em São Paulo podem ser evitados com a consultoria e orientação de um advogado especializado, que vai analisar as particularidades do caso e aplicará a solução ideal.
Cardoso ainda informa que é possível destinar a arrecadação do dinheiro a um investimento de baixo risco. Neste caso, os alunos interessados deverão discutir as possibilidades e buscar um consenso. “Sendo essa a opção, é de extrema importância contratar um especialista em investimento e investir em um banco tradicional, sempre formalizando o todo decidido”, discorre. Independente da forma de arrecadação de valores, o advogado lembra que o mais importante é sempre prestar contas aos formandos.
“Quanto menor o intervalo, melhor, pois é na prestação de contas que todos os alunos tomam conhecimento dos valores existentes em caixa, dos débitos e dos créditos, da destinação dada aos valores arrecadados, tudo detalhado. A prestação de contas não tem o caráter meramente econômico e financeiro, mas também satisfativo, podendo ser questionado tudo aquilo que tiver relação com o dinheiro arrecadado; não sendo satisfeita, poderá ser objeto de impugnação”, esclarece.
Organização
O diretor da Spot Formaturas, Henrique Azevedo, defende que o primeiro passo para organizar a comemoração é procurar uma empresa de confiança, com credibilidade e, se possível, com escritório físico na cidade, o que dificulta golpes e empresas fantasmas. Além disso, a turma deve tentar unir os estudantes com maior interesse e comprometimento para a comissão de formatura, pois será um processo longo e de muita responsabilidade.
Para os formandos se resguardarem de golpes, com o que aconteceu em São Paulo, Azevedo afirma que o principal seria a verificação do histórico da companhia contratada.
Henrique Azevedo defende que o primeiro passo é procurar uma empresa de confiança, com credibilidade e, se possível, com escritório físico na cidade
“Caso seja nova no mercado, o alerta deve ser ligado e as prevenções devem ser tomadas. Quanto menos histórico da empresa, maior o risco. Nós, inclusive, trabalhamos com um banco de eventos que consegue assegurar a transparência diária do dinheiro da turma e todos os gastos são acompanhados e autorizados pelos formandos”, explica.
Para garantir a lisura das arrecadações ao longo do tempo, a empresa contratada pode auxiliar a turma e a comissão, segundo o diretor da Spot. “No nosso caso, toda contratação dos serviços é claramente mostrada e dividida com a comissão, o que passa segurança para os formandos que o dinheiro está mesmo sendo empregado nos serviços contratados pelos formandos”, ressalta.
Além disso, ele detalha que o preço de um baile de formatura varia de acordo com a escolha dos formandos para cada tipo de serviço, mas um pacote com 10 convites pode variar de R$ 4 mil a R$ 15 mil, envolvendo salão, buffet, bebida, comida, atração musical, decoração e brindes customizados.
O estudante de Jornalismo na Unaerp, Kléber Fernandes, de 20 anos, faz parte da comissão de formatura e está no terceiro ano do curso. Para garantir a tranquilidade da turma em relação às arrecadações e movimentações exigidas para a festa, ele conta que a comissão decidiu procurar uma empresa especializada que tem uma excelente reputação e anos no mercado.
Kléber Fernandes disse que é uma tarefa difícil lidar com a responsabilidade da comissão de formatura, mas ao mesmo tempo é gratificante realizar esse sonho
“Em relação ao pagamento, optamos em deixar direto com a empresa responsável, até porque optamos em não ter contato direto com o dinheiro. Afinal, ninguém é obrigado a confiar em um aluno que não conhece muito, mas em uma empresa consolidada e firme é melhor. Queremos passar segurança para os formandos e ajudar na realização de uma festa incrível”, define. De acordo com ele, é bem difícil lidar com a responsabilidade da comissão, por conta das diversas reuniões e toda a organização exigida.
“Começamos a planejar a formatura em agosto do ano passado. Nossa meta era fechar contrato com uma empresa de formatura e cumprimos. Agora, o próximo passo é fechar o contrato com a empresa fotográfica. Ao mesmo tempo que é difícil, é gratificante ver o quão duro estamos dando para dar resultados nessa formatura. Infelizmente, a maioria de nós não conseguiu ter uma formatura de 3º colegial, por conta da pandemia, então vamos fazer uma festa de graduação universitária inesquecível”, comemora.
Já a médica Mariana Dentello Del Campo, de 25 anos, foi secretária da comissão de formatura e formou-se na Idomed Ribeirão Preto no ano passado. Ela afirma que, na maior parte das decisões, a comissão dava opções e pedia para a turma escolher entre elas.
Mariana Dentello Del Campo formou-se em Medicina e conta que a comissão sempre prestava contas aos colegas
“Minha turma é pequena, então nunca tivemos que lidar com muito dinheiro. Cada aluno fechou a festa de formatura diretamente com a empresa. Sobre outras festas e atributos da comissão, sempre prestamos contas para os colegas e recebíamos o valor destinado à aquela ação específica, assim não tínhamos dinheiro em mãos”, comenta. Mariana conta que a responsabilidade é imensa, mas a comissão da turma foi bem diversificada, dessa forma conseguiram captar um pouco de cada pessoa da sala.
“Além disso, por ser uma turma pequena e, até certo ponto, fácil de lidar, os sonhos individuais foram transformados em coletivo e fazer a festa ficou mais simples. Uma comissão de formatura precisa transparecer confiança à turma, por isso, a escolha dos membros deve ser democrática e a turma deve conhecer bem cada um. Nós ainda enfrentamos a pandemia, o que deixou a programação mais apertada, mas quando são pessoas comprometidas e que cumprem a confiança que lhes foi cedida, tudo dá certo”, acredita a médica.
Fotos: Revide/Divulgação