Falta participação feminina na política

Falta participação feminina na política

O maior eleitorado do país está sub-representado, tanto nas eleições como nas cadeiras ocupadas, em todas as esferas governamentais, em todo o Brasil

Apesar de o Brasil ser vanguarda na América Latina em relação à legislação que defende o direito da mulher na participação política — confere uma obrigatoriedade partidária de participação de 30% das mulheres em pleitos eleitorais —, na prática, as mulheres seguem sub-representadas em todas as instâncias de poder, mesmo sendo o maior eleitorado do país. Segundo Karen Santos, socióloga, mestre em Ciência Política e professora universitária, na análise das cidades e dos municípios do estado de São Paulo, a participação efetiva das mulheres na política é muito parecida com o que se vê no Congresso Nacional, onde elas não chegam a ocupar 10% das cadeiras. “Essa visão nacional das eleições também se reflete sobre as eleições municipais”, afirma Karen.
 

Para a professora, a conjuntura e a estrutura histórica explicam um pouco dessa sub-representação no sentido nacional e também em Ribeirão Preto. “A estrutura social, historicamente, atrasou o processo de dignidade, de acesso a direitos e especialmente o direito político das mulheres no âmbito geral. Temos as oligarquias partidárias, que são muito avessas a qualquer tipo de candidatura feminina, a não ser aquelas alinhadas à pauta oligárquica do partido. Isso tudo impede pautas que toquem as necessidades das mulheres de avançarem, seja no âmbito municipal ou nacional”, explica Karen.
 

Em Ribeirão Preto especificamente, nas eleições de 2024, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o número de mulheres candidatas representa muito menos da metade do número de eleitoras. “Das 400 candidaturas que existem na cidade, apenas 131, segundo o TSE, são femininas, o equivalente a 33% do total, enquanto as mulheres votantes são mais da metade. Das 22 cadeiras da Câmara de Vereadores, apenas três são ocupadas por mulheres. Isso demonstra que essas mulheres não são representadas corretamente em termos de participação política. Podemos atribuir isso ao machismo estrutural, à ideia de patriarcado, de uma sociedade misógina, mas também temos que olhar para os reflexos das reformas eleitorais ou das minirreformas eleitorais”, ressalta a socióloga.

“Em vez de estimular a participação da mulher na política, o Congresso Nacional aprovou uma PEC anistiando os partidos das cotas”, aponta Karen Santos, socióloga

Dilema

Karen relata que nas eleições municipais de 2020, houve um número muito alto de mandatos sendo cassados pelo TSE porque os partidos não cumpriram os 30% das cotas para as mulheres ou colocaram candidaturas “laranjas” para cumprir a cota. “Em vez de termos com isso um estímulo à participação da mulher na política, vimos justamente o oposto: o Congresso Nacional aprovando uma PEC de anistia aos partidos que não cumprirem as cotas dos 30% de candidaturas femininas, para evitar que os partidos e mandatos sejam cassados. Ou seja, além de termos um atraso histórico em relação ao estímulo à participação política, temos ainda uma conjuntura nacional que acaba por privilegiar os partidos, no sentido de anistiar, de isentar do ponto de vista econômico e também do ponto de vista do mandato, o cumprimento da Lei”, critica a socióloga.

 

 

O QUE DIZ A LEI

A Lei das Eleições (9.504/97) exige que os partidos políticos assegurem o mínimo de 30% e o máximo de 70% de candidaturas de cada gênero. O TSE tem intensificado a fiscalização para combater fraudes nessa área, com jurisprudência consolidada sobre o tema. Em maio deste ano, a Corte aprovou a Súmula n° 73, do seguinte teor: “A fraude à cota de gênero, consistente no que diz respeito ao percentual mínimo de 30% de candidaturas femininas, nos termos do art. 10, § 3°, da Lei 9.504/1997, configura-se com a presença de um ou alguns dos seguintes elementos, quando os fatos e as circunstâncias do caso concreto assim permitirem concluir: votação zerada ou inexpressiva; prestação de contas zerada, padronizada ou ausência de movimentação financeira relevante; ausência de atos efetivos de campanha, divulgação ou promoção da candidatura de terceiros. O reconhecimento do ilícito acarretará as seguintes consequências: cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) da legenda e dos diplomas dos candidatos a ele vinculados, independentemente de prova de participação, ciência ou anuência deles; inelegibilidade daqueles que praticaram ou anuíram com a conduta, nas hipóteses de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE); nulidade dos votos obtidos pelo partido, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário (artigo 222 do Código Eleitoral), inclusive para fins de aplicação do artigo224 do Código Eleitoral”, se for o caso.

FONTE: Juiz Cássio de Ortega Andrade

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