Suspeito de financiar atos golpistas falava em "ataques em massa" dias antes dos atentados
Genival Silva, de Ribeirão Preto, foi um dos acusados pela Advocacia-Geral da União (AGU) de financiar atos golpistas em Brasília
O publicitário Genival Silva é um dos suspeitos de financiar os ataques golpistas aos três poderes em Brasília, no dia 8 de janeiro, segundo a Advocacia-Geral da União (AGU)
A AGU solicitou à Justiça Federal do Distrito Federal o bloqueio de R$ 6,5 milhões em bens de 52 pessoas e sete empresas que são suspeitas de financiarem o transporte dos envolvidos nos atos de contra a democracia.
Entre os acusados, estão duas pessoas de Ribeirão Preto. Além de Genival Silva, aparece também o nome de Márcia Regina Rodrigues.
Atuante no Whatsapp
Genival Silva mantinha um grupo no Whatsapp chamado de "Aliança Ribeirão". Às 13h16 do dia 4 de janeiro, Gê Silva, como era conhecido pelos membros, mandou uma mensagem sobre possíveis ataques.
“Se vamos atacar é preciso planejar. O ataque tem que ser em grande massa e organizado, com locais e objetivos previamente definidos”, escreveu Silva.
Na noite do mesmo dia, o grupo mudou de nome. Passou a se chamar "Vamos a la playa".
Segundo publicações de integrantes do grupo, a mudança ocorreu como forma de precaução porque eles estariam sendo "observados" por membros do novo governo.
A tal viagem à praia seria um código para uma caravana à Brasília no final de semana em que ocorreram ataques. O preço cobrado por pessoa seria de R$ 70 por pessoa. Em média, uma passagem de Ribeirão Preto com destino à Brasília custa cerca de R$ 250 por pessoa.
Outro lado
O Portal Revide tentou contato com Márcia, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. Já Genival Silva respondeu à reportagem.
Confira as respostas dadas por Genival Silva:
– Sobre a lista divulgada pela Advocacia-Geral da União que consta o seu nome como um dos possíveis financiadores dos atos em Brasília. Como o ônibus à Brasília chegou ao valor de R$ 70? Contou com o apoio financeiro de alguém? Você financiou algum ato?
A AGU colocou meu nome lá porque meu nome consta como contratante da empresa [de turismo]. Foi um grupo de pessoas que contratou, mas coloquei meu nome lá como contratante porque eu fiquei com a parte da arrecadação das pessoas que iriam para a Brasília.
Nós não somos como a esquerda que tem patrocínio da CUT, CGT e de outros sindicatos. Não precisamos disso, quando a gente quer fazer uma ação, nós fazemos e cada um paga a sua parte. E ninguém paga para a gente ir nas manifestações. É um movimento da própria sociedade, é um movimento sem líder. É um movimento social que quer um país sem corrupção.
Teve gente que doou dinheiro, R$ 100, R$ 200, e até R$ 300 e não foi para Brasília. As pessoas colaboram para que as coisas aconteçam. Depois que eu recebi de todo mundo, eu repassei em dinheiro para o motorista. É uma transação normal entre uma empresa de turismo e os seus clientes.
Cada passageiro pagou a sua passagem. Na hora que me passaram para eu organizar a lista, me passaram que estava faltando um valor X e eu dividi pelo número de passageiros que cabia no ônibus. O valor que faltava para completar o ônibus. Mesmo porque, temos um grupo de umas 30 a 40 pessoas que ficava no quartel de Ribeirão e pedia o arquivo 142 que está na constiuição. Ninguém está pedindo golpe nem nada. Nada fora da Constiuição. Como o Bolsonaro falava: dentro das quatro linhas.
Eu sou publicitário, faz três anos que eu nao tenho receita nenhuma. Estou vivendo porque meu filho paga a minha alimentação. Porque eu nao tenho receita nenhuma. Minhas contas bancárias estão sem movimentação.
Após a publicação da matéria, Genival Silva procurou a reportagem e mudou a versão de alguns trechos da resposta anterior. Segundo ele, os valores de R$ 100 a R$ 300 não foram doados, mas convertidos em passagens. O excedente, segundo ele, foi destinado à compra de alimentos não perecíveis que seriam doados nos acampamentos em Brasília.
"Essas pessoas compraram passagens. Teve gente que uma, duas, até quatro passagens. Nós arrecadamos mais do que o valor do ônibus por isso. E aí, o que passou, compramos em alimentos não perecíveis e levamos no ônibus que seriam doados para os acampamentos em Brasília. Contudo, quando chegamos lá, a Polícia não deixou o ônibus chegar perto do quartel e não conseguimos levar essa alimentação para o quartel. Na volta nós trouxemos essa alimentação. Chegando aqui, dividmos em cestas básicas e distribuímos aqui no bairro", declarou Silva posteriormente.
– E no print em que você menciona "ataques". O que você queria dizer com essas mensagens?
Eu nem lembrava mais desse print. Eu fiz baseado em um texto original do Olavo de Carvalho, ele falava sobre ações e não ataques. Então você troca "ataques" por "ações". Na verdade, o ataque era o que a mídia falava que a gente fazia. Os ataques eram o nosso posicionamento em frente aos quartéis. Ninguém estava orquestrando ataques.
Em frente aos quartéis, a mídia sempre colocou a gente como atitudes antidemocráticas. Ora, como pode ser antidemocrático com as pessoas todas de verde e amarelo, enroladas em bandeiras e cantando o hino nacional?
Ataque é porque todos os dias éramos atacados pela mídia. No meu caso ai eu me posicionei mal, era porque estavamos sendo atacados pela mídias todos os dias.
Então a mensagem ficaria: "se vamos ter ações é preciso planejar...". Inclusive eu nem participei de conversações em Brasília.
A única coisa que eu ouvi era que o pessoal iria descer para a Praça dos Três Poderes fazer uma espécie de um segundo acampamento. A Polícia, inclusive, ajudou esse pessoal a descer.
A ideia era ser um desgaste para o Lula. As pessoas negociacem com o Lula algumas pautas. Porque ele tem algumas pautas muito agressivas contra a sociedade. Essa era a ideia e não de entrar e quebrar tudo.
Durante a entrevista, Silva defendeu, sem provas, a ideia de que havia "infiltrados" e que os ataques e a destruição do patrimônio público teriam sido causados por esses infiltrados.
Processo nas redes sociais
Em 2021, Genival Silva foi indeizado a pagar R$ 10 mil a um médico do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto após ataques nas redes sociais por defender as medidas de prevenção ao Covid-19. A decisão foi proferida em um acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) no dia 16 de junho.
A vítima foi Ulysses Strogoff de Matos, que é médico assistente da Unidade Especial de Tratamento de Doenças Infecciosas (UETDI) do HC, área destinada exclusivamente ao tratamento da Covid-19. Strogoff também é presidente do Sindicato dos Médicos do Estado de São Paulo (Simesp) em Ribeirão Preto e filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT).
No dia 3 de abril de 2020, o médico foi convidado a participar de uma reportagem na emissora EPTV, na qual falava sobre a aglomeração de pessoas em praças e parques, que estava proibida na ocasião por decreto municipal.
Um dia após a matéria ir ao ar, uma publicação de Genival Silva, com a imagem do médico começou a circular no Facebook acompanhada das frases que, no entender da Justiça, caracterizaram injúria e difamação.
Na publicação, Silva chamava Strogoff de "rato", "médico sem caráter", entre outras ofensas. "PTRALHA EX CANDIDATO A VEREADOR PELO PT É O MÉDICO QUE ORIENTA O JORNALISMO DA EPTV", escreveu Silva. Em um dos comentários da mesma publicação, o réu declarou que "as intervenções dele [Strogoff] na EPTV são todas carregadas de maldades políticas, a principal característica dos ptralhas".
À época, Silva não retirou as acusações feitas ao médico e ao HC. "Eu não retiro nada do que disse, continuo achando ele tudo isso e mais que eu não vou falar aqui para não me comprometer. Eu acho ele horrível. Ele e todos os que seguem a linha dele. São assassinos", afirmou.
O publicitário conta que o sogro de seu filho morreu vítima da Covid-19 no HC e culpa Strogoff e o hospital por não adotarem o "tratamento precoce". "Ele [Strogoff] é responsável pela morte do sogro do meu filho por tratamento equivocado do Covid-19. O Hospital das Clínicas trata, ou tratava, os pacientes da Covid de maneira totalmente equivocada, e os médicos sabendo qual era o tratamento correto", disse Silva.
*Matéria atualizada às 14h:49 de quinta-feira, 19 de janeiro para acrescentar nova versão dada por Genival Silva sobre as doações para a viagem à Brasília.
Foto: Reprodução Redes Sociais