Uma cidade com cultura no DNA
Vista aérea do centro de Jaboticabal, coom a Matriz de Nossa Senhora do Carmo e a Fonte

Uma cidade com cultura no DNA

Efervescência intelectual e instituições centenárias de Jaboticabal justificam epítetos como Athenas Paulista e Cidade da Música

O nome da 5ª cidade a abordarmos nesta série sobre a Região Metropolitana de Ribeirão Preto – que desde janeiro enfoca, a cada mês, uma de suas 34 cidades – é inspirado em um bosque de jabuticabeiras nativas que existia dentro do seu primeiro perímetro demarcado, lá pelo início do século 19. O nome oficial ficou sendo Jaboticabal, mas pode-se chamá-la também de Cidade das Rosas, de Athenas Paulista, de Cidade da Música, de berço dos filtros de cerâmica e, mais recentemente, de Capital do Amendoim, títulos que coleciona desde sua fundação oficial, em 16 de julho de 1828.

Mais velha que Ribeirão Preto, Jaboticabal está a quase 60 km da sede metropolitana e a 360 km da capital do estado, São Paulo. Distribuída por um território de 706,602 km², possui 71.821 habitantes, segundo o último Censo (2022) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o que resulta em uma densidade demográfica de 101,64 habitantes por km².

Seu IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) – que compara indicadores de riqueza, alfabetização, educação, esperança de vida e natalidade de um país, com o intuito de avaliar o bem-estar de sua população – de 0,778 está na faixa atribuída a nível médio de desenvolvimento (0,500 a 0,799), mas muito próxima da nota limítrofe com os mais elevados (0,800).

O prefeito Emerson Rodrigo CamargoPara o atual prefeito, Emerson Rodrigo Camargo, que nasceu, cresceu e formou-se no município, Jaboticabal deve seu IDH à “harmonia entre as práticas sociais, sustentáveis, humanizadas e humanizadoras, políticas e culturais da sociedade local”. “Jaboticabal se destaca também no terceiro setor, onde as nossas entidades sociais e assistenciais acolhem, amparam, formam e defendem o direito à dignidade e à vida de necessitados de justiça social, em asilos, casas de acolhimentos e abrigos, institutos para pessoas com deficiência, instituições formadoras educacional e cultural de crianças e jovens adolescentes”, afirma Camargo.

 

Educação e saúde

 

Segundo o historiador, advogado e livreiro Clóvis Roberto Capalbo, autor de volumes sobre a história da cidade, o setor da educação sempre foi fonte de orgulho para os jaboticabalenses, desde os primórdios do século 20. Entre 1917 e 1932, por exemplo, a cidade teve uma das primeiras Faculdades de Odontologia e Farmácia do país, e seu Ginásio São Luís foi qualificado entre os melhores do Brasil. “Ambos foram desativados por incompatibilidade política com o Executivo da época. Por outro lado, é bom ressaltar que o Colégio Santo André, das ordenações Andrelinas, iniciou como internato em Jaboticabal, em 1914, e até hoje se mantém ativo”, afirma. O surgimento de faculdades contribuiria consolidar um cenário de efervescência cultural e intelectual que moldaria a história do município.

De acordo com o prefeito, até os dias atuais a cidade se destaca na região metropolitana por ser voltada à formação educacional, qualificada desde o ensino infantil – garante que, ao longo de 2022 e 2023, o município conseguiu zerar as filas por vagas em creches. Atualmente, o ensino superior congrega, na cidade, as públicas Faculdade de Ciências, Agrárias e Veterinárias da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e Fatec (Faculdade de Tecnologia), além das privadas Faculdade São Luís e Moura Lacerda.

No Ensino Fundamental, a qualidade do ensino nas escolas públicas jaboticabalenses ficou na média, na última avaliação divulgada do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) – em 2021, os anos iniciais atingiram nota 6,2, e os finais, 3, numa pontuação de 0 a 10.

Já o atendimento em saúde básica, no município, consome uma média de 33% do orçamento anual da Prefeitura, que em 2024 foi previsto em torno de R$ 420 milhões, segundo estimativas do pesquisador histórico e assessor de Políticas Públicas da Câmara de Jaboticabal, Abel Ziviani, formado em História, Pedagogia e Geografia. Ainda de acordo com suas pesquisas, perto de 57% da população jaboticabalense depende exclusivamente do SUS (Sistema Único de Saúde), 29% pagam planos e “assemelhados” e 14% recorrem a particulares.

 

Cultura

O pesquisador histórico Abel ZivianiÉ Ziviani quem conta a história dos epítetos de Jaboticabal relacionados à vocação cultural do município. De acordo com ele, o de “Cidades das Rosas” foi dado em 1921, pela jornalista, escritora, atriz, dramaturga, líder feminista e poetisa gaúcha Andradina América de Andrada e Oliveira (1864-1935). Ela teria se encantado com uma Jaboticabal no auge de sua cultura, e com casas ornamentadas por exuberantes jardins, nos quais sobressaíam-se roseiras.

Também na década de 1920, o professor Amador Cobra, em palestra no antigo “Gymnasio San Luis”, usou pela primeira vez o cognome Athenas Paulista para Jaboticabal, comparando-a à cidade da Grécia antiga conhecida como centro artístico, estudantil e filosófico, berço da escola de Platão. O município abraçou o título com grande orgulho, o que levou à inauguração, em 1978, por ocasião dos seus 150 anos de fundação, de um marco simbolizando Athenas em uma das entradas da cidade.

Por fim, os títulos de “Cidade da Música” ou “Campeã de Música” foram cunhados na década de 1950, pela história de glamour protagonizada pela Corporação Musical “Gomes e Puccini” e pela Banda Filarmônica “Pietro Mascagni”, respectivamente campeãs e vice-campeãs estaduais de concursos em suas esferas de atuação. “Elas foram responsáveis pela ‘importação’ de dois maestros da Itália: Frederico Grossi, pela “Gomes e Puccini”, e Michelino Maisano, pela ‘Pietro Mascagni’. Ambos com formação militar no Régio Esercito Italiano, de onde trouxeram toda a disciplina da música italiana, que acabou reverberando em todas as áreas da cultura local”, narra Ziviani.

 

Segundo ele, desde 1940 Jaboticabal também abriga a tradicional Orquestra Sul América, uma das mais antigas de baile em atividade no Brasil; a partir de 1958 passou a contar com a Banda Musical São Luís, quatro vezes campeã estadual e oito vezes campeã regional em sua categoria; tornou-se sede de verdadeiras “Big Bands Caipiras”; e desde 1978 conta com a Arley e sua Orquestra, vinda de Catanduva. Todas – inclusive a centenária Gomes e Puccini –permanecem em atividade até hoje. “Por tudo isso, diz-se que Jaboticabal já foi a cidade do interior paulista com o maior número de pianos per capita”, comenta o pesquisador.

Patrimônio e Turismo

A vocação cultural influenciou também o patrimônio arquitetônico de Jaboticabal, que até os dias atuais conjuga modernidade e resquícios dos estilos ecléticos e colonial do casario erguido no auge da cultura cafeeira na região – primeiras décadas do século 20. São exemplos dessa época, a unidade escolar municipal Coronel Vaz, tombada pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico do Estado de São Paulo), a centenária Escola Estadual Aurélio Arrobas Martins, mais conhecida como “Estadão”, o já citado Colégio Santo André, e o Cine Theatro Municipal “Manoel Marques de Mello” (1927), entre outros.

Grande apelo ao turismo religioso é o Santuário de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, segunda maior igreja construída no país em devoção à Padroeira, que contém o Memorial da Menina Cega – referência a milagre registrado em Aparecida há 148 anos, mas que permanece vivo na memória de fiéis jaboticabalenses por ter se tratado de cura de uma moradora na cidade.

Jaboticabal também abriga a matriz Catedral Diocesana de Nossa Senhora do Carmo, de 1927, a Fonte Luminosa “Vitória Régia” (1967), o Museu Histórico “Aloísio de Almeida” (1979 - atualmente em reformas), a Concha Acústica “Lions Clube de Jaboticabal”, entre outros aparelhos culturais. Parte imaterial de seu patrimônio cultural são as festas populares que integram o calendário oficial do município. Já se tornaram atrações turísticas regionais, por exemplo, o Carnaval Jaboti Folia, a Festa do Quitute e Expo Feira de Arte e Artesanato (realizada em julho desde 1983), a Feira Nacional do Amendoim de Jaboticabal (todo mês de agosto), a Exposição Nacional de Orquídeas (setembro), a parada Jaboti Natal, que inclui feira natalina e concertos, além dos eventos Prova de São Silvestre (desde 1949), Corrida Athenas Paulista (desde 1986) e Corrida da Fraldinha (desde 1987).

 

UM POUCO DE MEMÓRIA...

De acordo com o historiador, advogado e livreiro Clóvis Roberto Capalbo, autor de volumes sobre a história da cidade, Jaboticabal foi fundada em território pertencente a Araraquara, a partir da aglomeração de lavradores atraídos pela fertilidade do solo. Seu fundador, João Pinto Ferreira, tomou posse em abril de 1826 da Sesmaria que lhe fora concedida, e em 1828 fez a demarcação do perímetro que mais tarde doaria ao Patrimônio de Nossa Senhora do Carmo. Ele faleceu em 1857, ano em que Jaboticabal foi elevada à categoria de Freguesia.

Em 1867, passou à categoria de Vila, conservando divisas e demarcações e subordinada ao município de Araraquara. Seu território inicial daria origem a várias pequenas cidades, que foram crescendo e se emancipando, como Barretos (desmembrado em 1885), Taquaritinga (1892), Pitangueiras e Bebedouro (1893). Em 6 de outubro de 1894, a Vila de Jaboticabal foi elevada à categoria de cidade. Um ano depois, foi criado ainda o município de Monte Alto, também desmembrado.


Dione Amista

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