
Agroindústria e agronegócio de Jaboticabal fazem dinheiro girar
De acordo com especialistas, segmentos respondem por 25% dos negócios em Jaboticabal; se entram em crise, a atividade dos outros 75% cai, pelo menos, à metade
Com um PIB (Produto Interno Bruto) per capita de R$ 48.434,25, segundo dados do último Censo (2022) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Jaboticabal tem sua economia centrada na agroindústria, que é bastante diversificada, mas com prevalência do segmento sucroenergético (de produção de açúcar e etanol), mesmo tendo apenas a Usina Santa Adélia sediada no município. “Outras que estão ao redor da cidade interferem na nossa economia porque muita gente que mora em Jaboticabal trabalha nelas, como a Usina São Martinho, a São Francisco, a Pitangueiras e a Raízen”, afirma Maurício Palazzo Barbosa, administrador de empresas e atual presidente da Associação Comercial, Industrial e de Agronegócio de Jaboticabal (Aciaja).
O administrador de empresas Maurício Palazzo Barbosa, atual presidente da Associação Comercial, Industrial e de Agronegócio de Jaboticabal (Aciaja)
De acordo com dados da entidade, outros segmentos a formarem a agroindústria jaboticabalense são os de máquinas e equipamentos, defensivos agrícolas, adubação foliar e, em menor escala, de medicamentos veterinários, equipamentos para academias e alimentos – neste último, entram, principalmente, empresas beneficiamento e produção de doces à base de amendoim, grande destaque da economia jaboticabalense. Fora dela, outros segmentos industriais relevantes no município são o de metalurgia, com fabricantes de peças, moldes e estruturas metálicas; e o cerâmico, especializado em filtros de água, que suprem a maior parte da demanda nacional pelo produto, levando o nome de Jaboticabal Brasil afora [leia mais a respeito em ‘Cerâmica projeta nome da cidade’).
Oficialmente, dos R$ 3,6 bilhões que compõem o PIB geral de Jaboticabal, a maior contribuição vem dos setores de comércio e serviços, que respondem juntos por 61,7%, seguidos por indústria (19,4%) e agropecuária (6,9%). Mas, segundo especialistas, esses números são “simplistas”, não refletindo as particularidades econômicas de um município e, no caso de Jaboticabal, “mascaram” o fato de a agroindústria e o agronegócio atuarem juntos como “grandes motores da economia local”, nas palavras de Palazzo, da Aciaja.
Ele explica que o dinheiro que entra no caixa das empresas da agroindústria e do agronegócio acaba se ramificando para os setores de comércio e serviços. “Seja o produtor rural ou o dono da agroindústria, sejam gerentes ou funcionários, toda equipe que trabalha no meio agro está consumindo na cidade”, diz Palazzo. “A maquininha de fabricar o dinheiro está nesses dois segmentos, responsáveis por 25% dos negócios no município. Mas é no comércio e nos serviços que esse dinheiro gira. Então, se esse ‘motor’ desligar muito, a atividade dos outros 75% cai pela metade”, acrescenta.
Diversificação gera estabilidade
Palazzo ressalta que a economia jaboticabalense se beneficia também de uma diversificação de segmentos nos setores não hegemônicos, o que considera “saudável”. “Jaboticabal não é uma cidade extremamente pujante, que cresce absurdamente. Ela tem um motor, que é o agronegócio, a oxigenar os serviços e o comércio, o que dá uma estabilidade. A cidade não estoura de crescer, mas não passa tantos altos e baixos”, afirma.
De acordo com dados de março de 2024 da base de dados do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), Jaboticabal possui um total de 9.365 empresas ativas, sendo 7.918 micro, 1.061 médias e grandes e 386 pequenas. O salário médio mensal dos trabalhadores formais é de 2,8 salários mínimos (R$ 4.592 pelo de São Paulo), segundo dados de 2021 do IBGE.
No período entre fevereiro de 2023 e fevereiro de 2024, o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) registrou no município 1.970 admissões e 746 demissões, o que resultou em um saldo positivo de 1.224 postos de trabalho.
O secretário municipal da Indústria, Comércio e Turismo de Jaboticabal, Lucas Souza Ramos Neto
Nas contas do secretário da Indústria, Comércio e Turismo da Prefeitura de Jaboticabal, Lucas Souza Ramos Neto, a cidade possui, atualmente, uma população economicamente ativa de 35 mil pessoas, e as dez maiores empregadoras são Coplana, Arca Retentores, Biofarma, UCDVet, Oxiquímica, Usina Santa Adélia, Agromix e NPA Pesquisas – “não por acaso, todas integrantes da cadeia do agronegócio”, frisa ele.
De acordo com Ramos Neto, o Executivo Municipal apoia o agronegócio no município por meio do projeto Arranjo Produtivo Local (APL), tocado em parceria com a Unesp Jaboticabal. “Na prática, consiste nos setores público e privado colocarem todos os envolvidos na cadeia produtiva de uma cultura gerando informações para seu desenvolvimento e planejamento de ações que gerem emprego e renda”, explica.
A cultura do amendoim foi beneficiada pela entrada no projeto há quatro anos. Apesar de não ser hegemônica em Jaboticabal, lidera as exportações do município, que fechou em R$ 72.627.964 em 2022, contra R$ 34.641.780 em importações, segundo o Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados). Em muito menor escala, também são exportados da cidade medicamentos veterinários e peças de montagem da metalurgia. “O açúcar não entra nessa conta porque sua exportação é feita via Coopersucar”, pontua Palazzo.
Ainda de acordo com o secretário Lucas, economicamente, a população de Jaboticabal está assim estratificada: 60% nas classes D e E; 20% nas B e C; 15% na A e 5% na AAA (altíssima renda). “A qualidade de vida aqui é muito boa. Pesquisas de avaliação de governo municipal apontam que 85% dos jaboticabalenses gostam de morar na cidade”, declara.
Agricultura
De acordo com o zootecnista e produtor rural Sérgio de Souza Nakagi (na foto à esquerda), atual presidente do Sindicato Rural de Jaboticabal, no campo, a cana de açúcar segue como a cultura majoritária em Jaboticabal, com 58 mil hectares (ha) de área plantada. Em segundo vem o amendoim, (13 mil ha), e em terceiro, a soja (3,5 mil ha), seguidos por milho (1,5 mil ha) e outras culturas (400 ha). Ao todo, o município possui em torno de 75 mil ha de áreas cultivadas por 220 produtores em 1.060 propriedades rurais, segundo dados do Sindicato.
Porém, o município tem sido mais recentemente – e oficialmente – reconhecido como “Capital Estadual do Amendoim” e nem tanto pela quantidade de sua produção ou área plantada no município, mas pelas 87,5 toneladas anuais que a Coplana – Cooperativa Agroindustrial recebe de produtores de dentro e fora do município, nos estados de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul, além de São Paulo.
Grande representante da agroindústria na cidade, a Coplana faz o que em economia é chamado de B2B (do inglês business to business, significando empresa que vende para outras empresas). Segundo Sérgio Nakagi, também vice-presidente da cooperativa, esta recebe, beneficia, faz pré-limpeza, seca, limpa e padroniza o amendoim, para entregá-lo semi-elaborado, torrado e blancheado às fábricas de doces.
De acordo com o economista e professor universitário Julio Cesar Bellingieri, o amendoim é uma das culturas agrícolas mais antigas em Jaboticabal. Dividiu espaço com café, arroz, milho, soja, algodão e cana-de-açúcar no município até a década de 1970, quando o Proálcool (programa do governo que criou a tecnologia de carros movidos a etanol) fez disparar a produção de cana em todo o estado, e perdeu terreno. Mas, na década de 1990, os produtores perceberam que poderiam aplicar de modo mais sistemático a rotação entre duas culturas usando a capacidade do amendoim de renovar e adubar a terra para posterior plantio da cana. “Foi assim que justamente a expansão da cana acabou trazendo novamente a expansão do amendoim”, comenta Bellingieri.
Ainda de acordo com ele, duas entidades locais foram cruciais para a conquista de um novo status pela cultura: a Coplana, que impulsionou investimentos em tecnologia e mecanização por parte dos produtores, abrindo o mercado do amendoim brasileiro para a exportação; e a Unesp, cujo curso de Agronomia tem um histórico de pesquisas que levaram ao aumento da qualidade e da produtividade do grão - a universidade, aliás, promove há mais de 20 anos um grande evento científico nacional relacionado ao amendoim.
Com isso, a produção do grão em todo o Brasil saltou, de cerca de 350 mil toneladas em 2014, para 890 mil toneladas em 2023, mais que dobrando, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). Só a Coplana detém, atualmente, 14% dessa produção nacional. “Em 2001, também fomos os primeiros a exportar amendoim, o que nos deu visibilidade.”, conta Nakagi.
Capital Estadual do Amendoim
Pela relevância que Jaboticabal acabou conquistando na cultura, em 2018 a Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou e sancionou o título de “Capital Estadual do Amendoim” para o município, que a partir de 2019 passou a sediar um evento misto de encontro científico e feira de negócios, com direito a shows e barracas de gastronomia à base do produto.
Fernando Ferreira (na foto à direita) é um dos produtores de amendoim jaboticabalenses que entregam toda a sua produção na Coplana. Sua família está na cultura desde 1985, mas ele conta que assumiu em 2011 e hoje planta em cerca de 70 hectares ao ano, obtendo uma produtividade média em torno de 185 sacas por hectare. “Do montante de amendoim recebido na Coplana, uma média de 25 mil toneladas são comercializadas no mercado interno e outras 25 mil ton destinadas à exportação”, afirma.
Ferreira diz que muitos fatores favorecem o cultivo do amendoim em Jaboticabal. “Principalmente o fato de estarmos no centro da região que mais desenvolveu tecnologias para a cultura, como sementes de alta qualidade e técnicas de manejo para aumentar o valor agregado ao produto. No meu caso e de outros produtores locais, o suporte da cooperativa em todos os processos, desde a compra da semente até a entrega do produto final, também ajuda muito”, afirma.
O único e grande obstáculo que ele enxerga para a expansão da área de plantio do amendoim na região são as mudanças climáticas, a influenciarem cada vez mais a colheita e, consequentemente, o plantio da cana [em áreas de rotação das duas culturas]. “O atraso na colheita de amendoim atrasa também o plantio de cana. A chuva tem diminuído muito nos últimos anos, o que acaba fazendo com que as usinas e muitos produtores de cana que repassam áreas para plantio do amendoim a diminuam ou deixem de repassá-las”, preocupa-se.
Fotos: ARQUIVO PESSOAL