Questão de saúde pública
Coordenador de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas de Ribeirão Preto, Marcus Vinicius Santos

Questão de saúde pública

Número de mortes por suicídios em Ribeirão Preto tem aumentado; especialistas abordam o tema

Ribeirão Preto ultrapassa a média nacional na taxa de mortes por suicídios a cada 100 mil habitantes. Segundo a coleta de dados feita pela Secretaria Municipal da Saúde junto ao Ministério da Saúde, em 2020, Ribeirão apresentou uma taxa de 6,9 óbitos, sendo a do país, 6,5. E o problema não é recente. Entre 2013 e 2014, a Região Administrativa de Ribeirão Preto ficou em terceiro lugar em um ranking de regiões do Estado de São Paulo com o maior número de mortes por suicídio, elaborado pelo Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade). Um agravante significativo nesses indicadores foi a pandemia da Covid-19. De 2020 a 2021 foi registrado um aumento de 42% nas mortes autoprovocadas, totalizando a média de 9,8 casos de suicídio a cada 100 mil habitantes.

 

Com as medidas de restrição e a sensação de luto constante, especialistas alertavam que a saúde mental poderia ser considerada mais uma onda da pandemia. “A quarta onda, dos traumas psicológicos e transtornos mentais aumentados em decorrência da pandemia, é a última onda a surgir, mas aquela que vai perdurar por mais tempo e ter maior impacto no sistema de saúde”, afirma o coordenador de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas de Ribeirão Preto, Marcus Vinicius Santos. De acordo com ele, fatores como o medo de adoecimento, perda  de renda, isolamento social, sequelas neuroló- gicas e psicológicas relacionadas a Covid, impactam diretamente e significativamente na saúde mental da população. Apesar da pandemia ter agravado as questões relacionadas a saúde mental, o suicídio é um problema de saúde pública complexo e multifacetado. “Ainda que abarque sofrimentos psíquicos e, dentre os transtornos mentais, a depressão e o abuso de substâncias psicoativas estejam mais frequentemente associados ao suicídio, a saúde e, mais especificamente, a saúde mental não se restringem ao domínio da psicologia/psiquiatria”, explica a psicóloga clínica, Ana Flávia de Oliveira Santos. “A atribuição de fenômenos que são sociais, econômicos, culturais e políticos a dimensões e características individuais e psíquicas é parcial, reducionista e enganosa”, acrescenta.

Psicóloga Ana Flávia de Oliveira Santos explica que suicídio é um problema complexo e multifacetado (Foto: Arquivo Pessoal)

 

NO DIA A DIA
A maior ocorrência de suicídios se dá entre os homens acima de 65 anos. No entanto, as mulheres são as que mais tentam. “Os homens relutam em procurar ajuda, são mais propensos a beber e serem mais impulsivos. Também são ensinados a serem fortes perante qualquer adversidade. Por outro lado, a depressão é mais frequente na mulher, muito por questões hormonais. E justamente os transtornos depressivos que apresentam uma maior taxa de suicídio. Mas geralmente, a mulher busca mais ajuda”, declara o psiquiatra e psicoterapeuta, Ibiracy de Barros Camargo. Entre os jovens na faixa dos 15 até os 30 anos o suicídio é considerado a maior causa de óbitos do mundo. Em casa e nas escolas, os responsáveis devem se atentar ao comportamento dos jovens. Por mais que não exista receita certa, existem alguns sinais de perigo consensuais para o suicídio, em que profissionais especializados devem ser chamados e alertado. Apesar do tabu sobre o tema, Ana Flávia explica que a conversa sobre o suicídio, principalmente com pessoas que possuem ideias suicidas, é melhor do que o silenciamento. “Deve-se validar a experiência da pessoa; abrir um canal de conversa; poder demonstrar que a percebe, evitando-se julgamentos e apelos de que melhore, já que, mesmo que bem-intencionados, não a auxiliam”, aponta. O professor do departamento de Psicobiologia da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, José Aparecido da Silva, lista alguns dos sinais e comportamentos que devem ser vistos com atenção. “Alguém ameaçando ferir-se ou matar a si próprio. Conversando ou escrevendo sobre morte e suicídio. Ademais, verificar se alguém exibe um ou mais desses comportamentos: desamparo, raiva, rancor, vingança, engajamento em atividades de risco aparentemente sem refletir sobre, sentimento de encontrar-se preso, amarrado e sem saída, aumento de uso de drogas e álcool, isolamento de amigos, familiares e sociedade, manifestar ansiedade, agitação, insônia ou sono excessivo, mudanças dramáticas no humor ou nos diversos sentimentos e emoções, nenhuma razão para viver, nenhum propósito no sentido da vida”, detalha.

Psiquiatra e psicoterapeuta Ibiracy de Barros Camargo destaca que homens procuram menos ajuda psicológica (Foto: Luan Porto)

 

NA MÍDIA

Docente e supervisora na clínica do curso de graduação em psicologia da Unaerp, e psicóloga, Juliana Vendruscolo (Foto: Luan Porto)


Há um código de ética tácito entre a mídia de que não se deve divulgar casos de suicídio. A recomendação tem embasamento científico. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que não se deve divulgar o método empregado, fotos ou cartas de despedida; evitar coberturas sensacionalistas, com glamourização da pessoa, julgamentos morais e visões simplistas sobre a motivação. Isso porque, tal exposição, comprovadamente, causa um aumento no número de óbitos por suicídio naquele período. A OMS recomenda que a divulgação deve priorizar o aspecto educativo e a abordagem ética e sensível.

O psicólogo Carlos Eduardo Lopes reforça que o suicídio é um fenômeno complexo e exige do profissional extrema atenção em todos os detalhes (Foto: Arquivo Pessoal)

PREVENÇÃO
A melhor forma de prevenção é aceitar ajuda e procurar um profissional de saúde mental. A docente supervisora na clínica do curso de Psicologia da Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp), Juliana Vendruscolo, conta que nem sempre o tema do suicídio é inicialmente relatado como queixa no divã. Porém, sempre que há menção a esse tipo de emergência a pessoa é recebida em regime de urgência. “Na escuta clínica, mesmo de emergência, procedemos juntos, paciente e psicólogo, a um tecer e destecer da narrativa de quem nos procura. Assim, juntos, tecendo novas possibilidades. Mas vale ressaltar, não há ajuda sem respeito, escuta e acolhimento”, declara. O psicólogo Carlos Eduardo Lopes reforça que o suicídio é um fenômeno complexo e exige do profissional extrema atenção em todos os detalhes do comportamento do paciente. “Deve-se acolher o paciente e buscar criar algum vínculo para que ele possa estabelecer uma relação de confiança”. Segundo ele, através da expertise e utilização de técnicas faz-se a avaliação de risco para definir a direção da conduta clínica e priorizar o atendimento multidisciplinar. “É possível prevenir o suicídio”, afirma Lopes. “Devemos ficar atendo as pessoas do nosso convívio social para ajuda-las quando necessário. Todas elas merecem o nosso apoio e com a ajuda de profissionais podem criar recursos internos suficientes para atravessarem os momentos de dores relevantes”, finaliza.

Professor da unidade de Psicobiologia da USP de Ribeirão Preto, José Aparecido da Silva aponta quais são os comportamentos que devem ser vistos com atenção (Foto: Arquivo Pessoal)

 

ATENDIMENTO PSICOLÓGICO GRATUITO
USP: (16) 3315-3739 e (16) 3315-3641
Unaerp: (16) 3603-7003
Barão de Mauá: (16) 3603-6697
Unip: (16) 3632-6401

 

Se você precisa de ajuda no momento, ligue 188. Centro de Valorização da vida Disponível 24 horas por dia e no seguinte horário por chat: 17h à 01h, segunda a quinta-feira, das 09h à 01h. Sexta-feira das 15h às 23h. Sábado das 16h à 01h.

 

Se você tem ou já teve pensamentos suicidas, busque ajuda de um profissional.


Foto: Luan Porto

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