Mais de 30 profissionais estão envolvidos em cirurgia de meninas siamesas em Ribeirão Preto
Em entrevista coletiva, especialistas comentam sobre o caso e o processo de separação das irmãs

Mais de 30 profissionais estão envolvidos em cirurgia de meninas siamesas em Ribeirão Preto

Médico responsável pelo caso diz que chance de nascimento de crianças siamesas é de uma em 1,5 milhão

De acordo com médico responsável pela cirurgia de separação das meninas siamesas em Ribeirão Preto, Hélio Rubens Machado, mais de 30 profissionais estão envolvidos no caso. A cirurgia avaliada em R$ 2,5 milhões no exterior, deve ficar cinco vezes mais barata com sistema do SUS utilizado pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina em Ribeirão Preto.

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Machado fala que a partir do momento que o hospital foi notificado por um colega médico de Fortaleza, houve o começo da programação para iniciar os procedimentos necessários. “Nossa missão era montar um grupo de pessoas, como é feito em outros locais especializados nisso. Esse grupo de pessoas começa o contato no hospital e tem que aceitar essa tarefa, que não é fácil. Foi isso que ocorreu inicialmente no HC e na nossa faculdade, em contato com a Secretaria da Saúde do Ceará para transferência das meninas”.

O neurocirurgião chefe diz que existem várias etapas no processo como procedimentos plásticos, terapia intensiva, enfermagem, anestesia, entre outros. “É muito complexo. O primeiro estudo é sobre a imagem, que é uma forma de montarmos esse quebra cabeça, ver como o cérebro está articulado, a circulação do local, se é possível separar e quais são os problemas técnicos. Uma vez feito este estudo, entrei em contato com o especialista americano James Goodrichque, que já tratou muitos casos como este e concordou vir até aqui nos auxiliar”.

Um protótipo da cabeça das meninas foi feito nos Estados Unidos para auxiliar na preparação da separação das siamesas. “Enviamos imagens aos Estados Unidos e um pessoal especializado em impressão 3D montou o protótipo que é fiel ao que vamos encontrar. O manequim é transparente com veias representadas em linhas vermelhas”, fala o neurocirurgião.

As veias são representadas em linhas vermelhas no manequim.

O professor Antonio Carlos, chefe da radiologia no hospital, conta que as imagens feitas das crianças nessa fase inicial foram focadas nas alterações de forma do corpo. “Foi um grande desafio estudar essas crianças, pois como elas estão unidas pelo corpo, em oposição a outra, torna muito difícil adaptá-las ao aparelho médico que não foi preparado para isso. Na ressonância magnética, por exemplo, temos de usar um hardware que é utilizado para isso. Então fizemos estudos”.

O radiologista diz que ainda existe muito trabalho pela frente. “O doutor ainda vai precisar de informações funcionais. O cérebro delas está adaptado à ligação, então elas têm uma forma anatômica de se adaptaram ao espaço diferente de um crânio sem estar ligado à outra pessoa. Foi um desafio, mas ficamos muito satisfeitos com o resultado, no entanto, ainda há muito trabalho pela frente. Esperamos ajudar ainda mais o departamento médico”.

Logística do processo

A equipe do HC fala que tudo começou de uma maneira, mas só é possível com o aval da administração. O diretor de atenção à saúde do Hospital das Clínicas, Antônio Pazin Filho, fala sobre o que significa para uma instituição grande como o HC montar um grupo de trabalho em equipe para enfrentar um problema como este.

“O desafio é grande, pois existe uma série de complicações logísticas. Primeiro são pessoas que habitam fora do estado, então precisa de uma logística segura de transporte e social para estas crianças em Ribeirão Preto. É uma situação inusitada e peculiar. Trazer alguém do exterior acoplado ao projeto também é novo para nós”, exalta Pazim.

Durante as etapas de cirurgia, o HC deve funcionar em horários especiais. “Vai ter abertura do hospital em horários especiais para evitar o fluxo de pessoas não envolvidas ao projeto. É bem complicado, mas ao mesmo tempo é gratificante. É uma experiência para o corpo clínico aprender a lidar com desafios novos. Um dos nossos objetivos como hospital terciário de ensino é aprender a lidar com essa situação. O trabalho prévio foi realizado para que não haja problemas”, explica Pazim.

Cirurgia Plástica

Uma parte importante do processo de separação vem com a cirurgia plástica, é o que diz o chefe da divisão do setor no HC, Jayme Farina Junior. “Quando for feita a separação das crianças, vai faltar tecido de revestimento na parte superior da cabeça. Esse é o desafio, por isso é importante que a equipe de cirurgia plástica esteja participando em conjunto com a equipe de neurocirurgia”.

Serão quatro etapas cirúrgicas semelhantes e a última mais densa.  “A quarta e final será o procedimento mais complexo e mais demorado, pois temos que idealizar de onde tiraremos retalhos de pele para a parte superior da cabeça. É um desafio, mas gera entusiasmo. Estamos empolgados e acreditamos que tenha uma boa chance de êxito ao final de todo procedimento”.

Jayme Farina Junior fala sobre o processo plástico das cirurgias.

Finalização

O intervalo em cada procedimento é necessário, “pois precisamos esperar que o cérebro delas se recupere. Em um ano, esperamos que as meninas estejam separadas. As veias são o maior entrave, pois são capazes de passar uma para outra, mas também o cérebro das duas estão muito próximos um dos outros, bem rentes, o que também é difícil. As três primeiras cirurgias vão demorar entre quatro a cinco horas, a última é imprevisível”, relembra Hélio Machado.

É possível que existam outros casos de siamesas, mas muitos casos não chegam à medicina. “Que se sabe atualmente no Brasil, temos apenas as irmãs Maria Ysabelle e Maria Ysadora com esta circunstância”, finaliza o médico responsável pela operação. As fotos da família foram preservadas por questões éticas.
 


Fotos: Pedro Gomes

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