Novembro Azul: prevenção nunca é demais

Novembro Azul: prevenção nunca é demais

Médico oncologista Felipe Maciel Pereira fala sobre a prevalência da neoplasia de próstata e outros cânceres entre a população masculina de Ribeirão Preto, que ainda precisa se cuidar mais

Em 2022 foram notificados em Ribeirão Preto 326 casos de câncer de próstata e 48 mortes em decorrência dessa neoplasia, a terceira mais frequente entre homens na cidade – a primeira é a de pulmão e a segunda, de intestino. Os dados da Secretaria Municipal da Saúde.  Por isso, veio a calhar que, a partir deste ano, a campanha Novembro Azul, promovido pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA) e Ministério da Saúde, esteja chamando a atenção não apenas para a necessidade de prevenção deste e outros tipos de câncer entre a população masculina, mas para o cuidado com a saúde do homem.

 

Atuante em Ribeirão Preto, o médico oncologista Felipe Maciel Pereira aprova a mudança de foco, já que, em seu acompanhamento diário de pacientes de câncer, na Santa Casa e no Centro de Tratamento Oncológico de Ribeirão Preto, ele nota que a detecção do câncer de próstata em estágio inicial aumentou nos últimos anos, muito graças à campanha, mas ao menos metade da população masculina ainda é relapsa quanto aos cuidados preventivos de saúde.

 

Mineiro de Varginha, Felipe é formado pela Faculdade de Medicina de Vassouras, no Rio de Janeiro, em 2017. Começou a acompanhar pacientes oncológicos na primeira Residência, em Clínica Médica, feita em hospital de Itajubá (MG), e veio para Ribeirão Preto já decidido a fazer Residência em Oncologia Clínica na Santa Casa. Somadas as duas experiências, acredita já ter acompanhado aproximadamente 300 pacientes em tratamento de câncer na cidade.

 

 

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, o câncer de próstata é a segunda doença que mais mata homens no mundo. Ribeirão segue essa tendência? 

Em relação à mortalidade, não. Temos muitas mortes devido à alta prevalência dele, mas o câncer de próstata é muito heterogêneo, com muitos subtipos. Na investigação, fazemos uma pontuação de classificação, de risco leve, intermediário favorável, intermediário desfavorável, alto risco e muito alto risco. Quando é risco baixo, podemos monitorar o paciente sem iniciar nenhum tipo de tratamento, apenas fazendo dosagens seriadas do PSA (Antígeno Prostático Específico) a cada três, quatro messes. Se o PSA estiver mais alto ou há suspeita de alguma lesão, temos um risco de intermediário a alto, então a gente indica tratamento. Alguns são o que chamamos de “indolentes”, com os quais a pessoa pode conviver sem nenhum problema.

 

Neste ano, o Ministério da Saúde divulgou uma portaria contraindicando o rastreio do câncer de próstata em pessoas assintomáticas para evitar o super diagnóstico, porque estavam sendo feitos muitos diagnósticos de câncer de próstata indolentes. Mas a partir do momento em que o homem ouve a palavra câncer, gera todo um estresse, então fica difícil convencê-lo de que ele não vai ter nenhum problema. Mas há vários estudos nesse sentido. Inclusive, um que saiu em 2020, na Europa, acompanhou pacientes com câncer de próstata durante 16 anos e constatou que fazer o diagnóstico em homens assintomáticos não mudou o desfecho e a sobrevida deles em relação aos dos sintomáticos. Por isso a recomendação é: se tiver alguma alteração urinária, erétil ou algum tipo de sangramento, procure investigar. Mas quem estiver assintomático, não investigue. 

 

 

A detecção precoce influencie as chances de cura e a escolha do tratamento?

Com certeza. Quando detectamos em um estágio inicial, temos três opções: manter vigilância sobre o paciente com PSA seriado, fazer cirurgia de prostotectomia – que é a retirada da próstata – ou fazer bloqueio hormonal com radioterapia. Mas essas opções só valem quando a lesão está restrita ao interior da próstata. Caso o homem demore para procurar atendimento, a lesão pode crescer a ponto de atingir algum tecido próximo à próstata. Aí perdemos a opção da cirurgia. O PSA também pode subir e aí perdemos a opção da vigilância, restando apenas a de radioterapia com bloqueio hormonal. E se demorar mais ainda, o câncer pode fazer metástase em outros órgãos e perdemos também a radioterapia. Quando o câncer está em um estágio muito avançado, o tratamento é paliativo, ou seja, vamos tentar controlar e evitar que progrida, mas sem expectativa de cura.

 

 

Dos casos que o senhor acompanha em Ribeirão Preto, qual percentagem é detectada no momento ideal para um tratamento mais efetivo? 

Percebemos que a maioria é detectada em fase inicial. Geralmente, no primeiro sintoma o homem procura atendimento. Mas ainda vemos demora em pacientes idosos em torno dos 70 anos, ou entre pessoas com resistência particular a procurar um médico. Nesses casos, o câncer de próstata é diagnosticado em fases avançadas. Mas são minoria, em torno de 10% a 20% [no universo que atende]. Esse percentual já foi maior, porque antigamente tinha um tabu sobre o exame. Neste sentido o Novembro Azul ajuda bastante. 

  

 

E a partir de que idade é recomendável que ele comece a fazer esse tipo de investigação, não só de câncer de próstata? 

Muito importante também a investigação do câncer de cólon [de intestino], que é o segundo mais incidente depois do de próstata e tirando o de pele. É recomendável fazer pelo menos uma colonoscopia a partir de 50 anos, para avaliar se tem alguma lesão no intestino ou outra coisa, e manter um vínculo com o médico – do posto mesmo ou um clínico geral que faça seu acompanhamento de saúde – para ele saber investigar queixas novas. Se o paciente for tabagista, é mais importante ainda por causa do risco aumentado de câncer de pulmão (80% têm relação com tabagismo). O paciente de 50 anos que não fuma, não bebe, não tem nenhum fator de risco, se faz a colonoscopia que resulta em um quadro normal, poderá voltar a fazer só depois de um ou dois anos. Já em alguém que fuma, o médico pede também um raio-x de pulmão.

 

 

Considerando que câncer de próstata costuma acometer mais idosos, o senhor observa se todos contam com suporte familiar adequado? 

Falta para muitos! Vejo muitos pacientes [idosos] irem sozinhos fazer exames e quimioterapia. É difícil! São várias consultas. Às vezes a pessoa passa mal. Sabemos que todo mundo tem sua vida, seu trabalho, mas é muito importante dar suporte ao paciente, ajudar, estar ao lado, porque é uma luta muito complicada. Adoro quando a família vem junto porque consigo consegue falar: ‘vamos lutar contra isso juntos’. E o paciente se sente melhor. Mas vejo muitos casos de pacientes sem apoio ou presença da família, infelizmente!


Foto: Luan Porto

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