Alta tecnologia e a boçalidade moderna

Alta tecnologia e a boçalidade moderna

“O Viagra mudou a forma com que a sociedade lida com a sexualidade”, comenta o presidente da Pfizer Brasil, Victor Mezei. Mark Zuckerberg, o fundador e principal executivo do Facebook.com, tentou explicar no mês passado os valores de sua empresa em artigo publicado no Washington Post. “O Facebook”, escreveu, “foi criado a partir de algumas ideias simples: a de que as pessoas querem compartilhar e permanecer conectadas com amigos e pessoas ao seu redor”, e que “se as pessoas tiverem controle sobre o que compartilhar, vão querer compartilhar ainda mais”, e que “se as pessoas compartilharem mais o mundo será mais aberto e conectado. E um mundo mais aberto e conectado é um mundo melhor.”

A simplicidade que beira a idiotice que encontrei nestes dois depoimentos de pessoas públicas, me fez refletir, e acabo concluindo, lembrando de Carlos Drummond: Eta vida besta, meu Deus!

A caixa com Viagra passa a custar R$15 nas farmácias e, com a quebra antecipada da patente, o genérico custará R$12. Recentemente, José Gomes Temporão o ilustre ministro da saúde, indicou sexo como uma alternativa para prevenir problemas de hipertensão.

Coincidências ou não, creio que os fragmentos a cima, explicam bem para onde caminhamos e como estamos tratando certas questões importantíssimas como se fossem triviais.

O Facebook e a internet promovem um mundo melhor e mais aberto, simplesmente porque as pessoas estão “conectadas” e compartilhando felizes bobagens cotidianas? Não. O fato de termos 3500 amigos virtuais não faz com que tenhamos relações humanas, e muitas vezes, trocamos o bom e velho convívio pessoal pela facilidade de se clicar e mandar uma mensagem de 140 caracteres, demonstrando nosso carinho e afeição. O Facebook pode ser ótimo, mas vamos combinar: Um mundo melhor se basear em relacionamentos virtuais? Papo furado.
A torrente de informações ocasionada pela internet vem sendo colocada como causa de um remodelamento de nossa relação com o mundo. Estamos nos habituando a ler pouco, ver noticias rapidamente e a sermos impacientes. O Jornal Folha de São Paulo mudou e se denomina “O Jornal do Futuro”. De fato, caixas de textos coloridas, letras enormes, notícias curtas, gostei. Mas só falta sair um braço de robô da folha e enfiar a informação goela à baixo do leitor. Isso tudo produzirá pessoas que sabem pouco (140 caracteres) de diversos assuntos? Uma geração enciclopédica? Sem aprofundamento de conhecimento? Eu não sei.

O importante para nossa conversa é a falta de paciência e ansiedade gerada pelo ritmo avassalador das coisas e pela instantaneidade gerada pela internet. Tudo dura o tempo de alguns clics. Penso aqui em como estamos necessitando de respostas rápidas e corretas para tudo. E para realizar esse desejo, o jornalismo se adaptou de maneira a produzir rapidamente pacotes de informações para consumo compulsivo dos clientes.

Vivemos em uma época da “mitificação da ciência”, em que a ciência passa de alguma forma, a substituir dogmas religiosos. A ciência é um modo dos seres humanos proporem perguntas e desenvolverem meios de respondê-las, gerando assim conhecimento. No campo religioso isso acontece da mesma forma. Mas o que diferencias então as duas coisas? Na ciência não há verdade absoluta. Sendo assim, chamamos de “falsificável”. Quero dizer: Toda ciência, de acordo com Karl Popper (um filósofo da ciência respeitadíssimo), gera hipóteses que podem e devem ser ultrapassadas e modificadas. Na religião, que também é uma forma de conhecer o mundo, temos dogmas que não devem ser questionados e necessitam ser aceitos como verdades. O que está acontecendo hoje é que a divulgação científica (ou jornalismo científico) anda tratando de modo tão banal a ciência que faz confundi-la com um dogma religioso qualquer, como se ela fosse capaz de dar respostas imediatas e absolutas sobre sua saúde, sobre o câncer, sobre o que você deve comer para se manter em forma e como ser feliz, etc.

Vai se modelando então uma sociedade regida pelo discurso científico, pela causa e conseqüência e pela necessidade de obtenção de prazer a qualquer custo. Isso no nosso psiquismo traz alguns aspectos importantes que observo na clínica como, por exemplo, a intolerância e falta de paciência com o outro (brigas de transito, abuso de drogas e demais violências).
A sexualidade humana também entra nesse discurso pobre, se limitando a um pênis duro, vagina lubrificada, benefícios no sistema serotonérgico e nos mecanismo que regulam a pressão arterial, e só.

Você está triste por quê? Tome um antidepressivo! Você está ansioso por quê? Tome um calmante? Você está impotente por quê? Tome um Viagra! Você não consegue ter filhos? Tente inseminação artificial! Parece então que todos os males da humanidade estão resolvidos e, no entanto, sabemos e sentimos que a insatisfação e o mal estar generalizados saltam aos olhos, numa simples caminhada pelo centro da cidade.

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