Por um mundo mais ignorante

Por um mundo mais ignorante

Não. Não enlouqueci. A palavra "ignorante" quase sempre é associada a pessoas que, por ignorarem algumas coisas cometem atos bárbaros, violentos ou antiéticos. Isso não é ignorância, isso é uma doença mental.

Quero aqui ressaltar a importância da ignorância em um mundo em que o saber se mostrou ineficaz. A importância da ignorância dos cientistas e dos pacifistas. Estou me referindo à ignorância socrática. Sócrates, o filosofo grego que tem atribuída a autoria da célebre frase: “Só sei que nada sei”.

Cria-se um paradoxo aí, pois, durante toda nossa vida, buscamos um certo conhecimento das coisas, vamos à escola, fazemos faculdade, buscamos a excelência em alguma profissão, ensinamos nossos filhos a não queimarem as mãos nas mesmas fogueiras que nós e por aí vai.

Penso que em todo ato de violência há um pressuposto: “Eu posso e devo subjugar o próximo pois eu sei quem ele é”. Assim, nazistas massacram judeus, heterossexuais massacram homossexuais, pois possuem claramente o conhecimento inequívoco de que o outro é de tal e tal forma. Adquirir conhecimento é uma característica muito marcante da nossa espécie que, não à toa, foi batizada de Homo Sapiens Sapiens: o Homo que sabe e que deseja incessantemente saber das coisas ao seu redor. Pois digo que isso não é apenas uma caraterística resultante da alta complexidade do nosso sistema nervoso, mas também um problema que temos que lidar diariamente.  Ao conhecer certo objeto visamos o esgotamento de todas as possibilidades de novas significações. Feito isso, duvidamos de tal esgotamento e manipulamos o objeto a fim de destruí-lo com o objetivo de observar profundamente - em sua estrutura mais íntima - o seu significado. Como uma criança que ao ganhar um novo brinquedo pega, põe na boca, morde e o destrói. A criança – e nós mesmos carregamos isso na vida adulta – tem associados o desejo de compreensão do mundo e a agressividade, que analisa, separa as partes do objeto para melhor verificação.

O problema começa quando aplicamos esse modelo – e não podemos evitar - ao outro ser humano, aos nossos filhos ou amigos, por exemplo. Na medida em que a relação se aprofunda, baseada em um desejo de conhecimento, se constroem as certezas sobre o que o outro é, sobre o que ele faria em diversas situações, sobre o que ele gosta e etc. Aprisionamos o outro em nossa mente de modo a eternizá-lo e, ao mesmo tempo, destruí-lo.  Por mais que você pense que conheça sua esposa, saiba que você não sabe e nunca saberá inequivocamente o que ela de fato é. Isso é impossível e indesejável.

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