Coluna Caipirinha (Revista Canavieiros) de Agosto - O Caminho da Índias

Coluna Caipirinha (Revista Canavieiros) de Agosto - O Caminho da Índias

O que acontece com nosso agro? 

De acordo com a UNICA, o cálculo atualizado mostra que desde 1975 o etanol possibilitou ao Brasil economizar US$ 190 bilhões em importações de combustível, o que equivale a 2,5 bilhões de barris de gasolina, um grande benefício à nossa sociedade.

De janeiro a julho, inclusive, o agro brasileiro exportou US$ 52,37 bilhões, e importou US$ 8,4 bilhões, deixando um saldo de US$ 44,16 bilhões. Em julho tivemos uma boa reação, com exportações passando de US$ 9,1 bilhões. Com o novo câmbio, acredito numa expansão das exportações ajudando o Brasil neste difícil momento.

A cadeia da cana exportou US$ 829 milhões em julho, boas notícias, renda de fora entrando no Brasil!

O que acontece com nossa cana? 

Com metade das 20 milhões de toneladas de cana estimadas para 2015/16 já processadas, a Tereos anunciou resultado médio de 87 t/ha e ATR de 126 kg/t.

Archer revisou suas estimativas para 15/16, permanecendo a produção de 581 milhões de toneladas, mas com menor ATR e maior alocação para etanol, levando a produção de 27,48 bilhões de litros, e a de açúcar caindo de 32,6 para 29,8 milhões de toneladas.

Estudo do PECEGE mostra que produtores na região de Araçatuba tem vendido a cana em média a R$ 61,83/tonelada, ante a um custo de produção de R$ 62,16. Ou seja, trabalha-se o ano todo para perder 33 centavos por tonelada vendida. Está aí mais um agente social no Brasil: o produtor de cana.

A segunda quinzena de julho foi de excelente rendimento para as usinas, com produção 25% maior no açúcar que o mesmo período do ano passado e 37% maior no etanol, recuperando o atraso e fazendo a moagem acumulada ficar praticamente igual ao ano passado.

O que acontece com nosso açúcar? 

O preço atingiu o menor patamar em 6,5 anos, chegando a praticamente 10 cents/libra peso. Está fortemente influenciado pela desvalorização do real, que impacta diretamente no preço. Resta saber com este preço, como fica o estímulo à produção no mundo. Em algum momento, há de ceder a produção.

É impressionante o potencial que a Índia tem de desrespeitar regras de mercado e interferir negativamente no mercado mundial de açúcar. Está em discussão no país a aprovação de volumes de exportação para o próximo ano safra (01/10), que possam tirar do mercado tudo o que for adicional à demanda, para manter preços internos que seriam “artificiais”. Seriam exportações feitas com prejuízo ao setor privado, com algum tipo de subsídio. Ao invés de reduzir a produção, ou direcionar mais cana para etanol, como é o caso do Brasil, a Índia vai em sentido contrário. Novas estimativas indicam que a Índia deve produzir 28 milhões de toneladas no ciclo 15/16, contra um consumo de 25 milhões de toneladas.

Por outro lado, talvez a melhor notícia do mês foi dada pelo Primeiro Ministro da Índia no dia 11 de agosto, anunciando que a partir de outubro de 2015, na próxima safra, será mandatório a adição de 10% de etanol à gasolina. Isto deve consumir 1,5 milhão de toneladas de açúcar. 

Outra boa notícia é que a Tailândia também aumenta a produção de etanol. A gasolina do país já é misturada a 10% de etanol, mas existem benefícios de preços para quem abastecer com E20 e E85, e para a indústria produzir automóveis que se adaptam. Estes benefícios fazem com que a mistura tenha sido de 12,3% em 2015, 14,4% em 2015 e 15,1% em 2016. Antes tarde do que nunca, é algo que peço já há cinco anos. Pelo menos para isto serviram os preços baixos do açúcar, para estimular o consumo de etanol nestes países. E uma vez colocado o mandato e estabelecidos os canais, fica difícil voltar depois.

Em julho, as exportações de açúcar atingiram 2,35 milhões de toneladas, com faturamento de US$ 728 milhões. Foi quase 18% maior que junho, mas 5,5% menor que julho de 2014. A receita foi 13% maior que junho, mas 27% menor que julho de 2014.

Há a expectativa que o El Nino trará efeitos positivos ao mercado de açúcar, pois começam a ser relatadas perdas devido à seca principalmente na Tailândia e talvez na Índia, grandes produtores na safra vindoura.

O que acontece com nosso etanol? 

Mesmo com a atual crise econômica no Brasil e com o aumento de preços da gasolina e do diesel, o mercado de combustíveis no primeiro semestre fechou 0,3% acima do consumo do mesmo período de 2014. O etanol deslocou parte do consumo de gasolina, tendo crescido 38%, enquanto que a gasolina caiu 5%.

No longo prazo, continuamos sem planejamento. A UNICA estima o gap de combustíveis no Brasil em gasolina equivalente, de 17,4 bilhões de litros em 2024 e o Ministério das Minas e Energia em 8,5 bilhões de litros. E o que está sendo feito?

Na segunda quinzena de julho a produção de etanol cresceu 37% em comparação ao mesmo período de 2014, com quase 2,2 bilhões de litros produzidos, sendo 891 de anidro e 1,3 bi de hidratado. No total do mês de julho vendeu-se das usinas para as distribuidoras 1,6 bilhão de litros de hidratado, 50% a mais que julho de 2014 e 6% a mais que junho de 2015. Foram 2,446 bilhões de litros. O anidro está estável em relação a 2014.

Mais uma vez o endividamento do setor atrapalha a rentabilidade. Usinas em dificuldades financeiras tem vendido o hidratado a preços muito baixos, puxando o mercado para baixo. Mesmo com consumo maior, isto não se refletiu em preços bem mais atrativos.  

Boa notícia em julho foi a reação das exportações, estimuladas pelo câmbio, tendo sido exportados 214 milhões de litros, quase 140% a mais que no ano anterior. Foram US$ 100 milhões, contra US$ 57,3 em julho de 2014.

Com o consumo elevado, a estratégia de estocar etanol pode ser vitoriosa, pois tendemos a ter preços melhores no final da safra e na entressafra.

Preços do petróleo tem grande interferência nos preços das commodities, e estão ao redor de US$ 50-55 o barril, os mais baixos do ano. Há excesso de produção no mercado (mesmo os preços menores não foram capazes de diminuir a produção, e em alguns casos, até elevar). Há analistas que acreditam que os preços podem inclusive virem a US$ 40 o barril, onde daí o consumo seria mais estimulado e a produção poderia recuar. Tempos fechados no preço do petróleo. 

Mas quando se considera o câmbio, a gasolina está mais barata no Brasil em cerca de 12% que no mercado externo. Segundo a GO Consultoria, esta defasagem fez com que a Petrobras tenha perdido R$ 528 milhões com a comercialização de gasolina apenas em julho. Podemos ter mais um aumento de preços.

O que acontece com nossa co-geração? 

Neste primeiro semestre, a cogeração aumentou 14% em relação ao mesmo período do ano passado, sendo comercializados 7,97 mil Gigawatts hora. É um crescimento bem menor que o observado em 2014, porém.

No ano todo de 2014, as usínas cogeraram 19,4 mil GWh, 21% acima de 2013. O setor tem condições de crescer, mas com os preços atuais ao redor de R$ 200 o MWh falta um pouco de estímulo. Há retração da atividade econômica e as chuvas estão dentro do esperado (UNICA).

Quem é o homenageado do mês? 

Todos os meses esta coluna homenageia uma personagem do setor de cana. Este mês, a homenagem vai para o José Arimatea Calsaverini, o Ari, que terminou um positivo ciclo de 6 anos como gestor executivo da Coplana. Pude acompanhar o trabalho de perto, e registro aqui meus parabéns ao Ari e ao time todo que entregou bons resultados no período. Parabéns à Mirela, que assume esta posição e bom trabalho a todos.

Haja Limão: 

Passei quatro dias na Argentina, um país que adoro, agora em agosto. Tenho orgulho de ser oficialmente professor visitante internacional da Universidade de Buenos Aires desde 2006, com uma a duas visitas por ano. Comecei por Rosário, fazendo palestra num congresso e terminei por Buenos Aires. Que tristeza conversar com os argentinos e ver a degradação e a falta de ânimo da pessoas. Os problemas lá são os mesmos de cá, porém em maior magnitude. Pelo menos chega ao vim a atual dinastia, pois em outubro tem eleições.

Finalmente... acho que o setor de etanol não deveria ter meta. E daí, quando ele atingir a meta, ele poderia finalmente, dobrar a meta. Sem mais comentários, a não ser... haja limão.

 

Marcos Fava Neves é Professor Titular da FEA/USP, Campus de Ribeirão Preto.

Em 2013 foi Professor Visitante Internacional da Purdue University (EUA) e desde 2006 é Professor Visitante Internacional da Universidade de Buenos Aires. 

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