Leitura dos Fatos da Cana em Dezembro

Leitura dos Fatos da Cana em Dezembro

Prof. Dr. Marcos Fava Neves

O que acontece com nosso agro?

O crescimento da economia mundial em 2015 deve ficar em 3%, menor que os 3,4% observados em 2014.

Diversos bancos e consultorias estão revendo para baixo o desempenho da economia brasileira em 2015 e 2016. Algumas esperam tombo acima de 3,3% neste ano e quase 3% em 2016. Um cenário complicado de redução de 6,5% na economia brasileira em dois anos.

A taxa de juros deve se manter em mais de 14% ao ano, agravando a situação das empresas endividadas.

Na soja, o USDA estima a produção americana em 108 m.t, a brasileira em 100 m.t. e a Argentina em 57 m.t. Para o Brasil a CONAB estima 102 m.t. plantados em 33 milhões de hectares (produtividade de 3,08t/ha). Cerca de 40% da produção já está vendida. Projeções indicam o mesmo preço em 2016.

No milho, o USDA estima produção americana em 347 m.t (4% menor), a brasileira em 81,5 m.t. e a Argentina em 25,6 m.t. Para o Brasil a CONAB estima 82 m.t., sendo 27,3 m.t. da primeira safra e 54 m.t. da segunda safra. O Brasil deve exportar mais de 28 m.t. Espera-se um preço relativamente maior.

 

O que acontece com nossa cana?

Finalizado novembro, a moagem chegou a 563 m.t., sendo 1,64% maior que na safra 2014/15. O mix da quinzena chegou a incríveis 67% para etanol. O mix da safra toda está em 58,7% para etanol. O ATR caiu muito no mês, o que puxou a média do ano para 132,66, mais de 3% menor que 2014.

O valor do ATR pelo Consecana em outubro já capta os novos preços e vai a R$ 0,5467 puxando a média da safra para 0,5026. Espera-se que a safra feche a R$ 0,5256.

Agroconsult fez projeções finais para esta safra (2015/16) e para a próxima (16/17) estimando que o resultado operacional das usinas será positivo em aproximadamente R$ 20 bilhões em cada uma das safras, o que permitirá a redução do endividamento (estimado em R$ 85 bilhões), em aproximadamente 10% ao ano. Em grandes números, estima-se o faturamento da casa de R$ 80 a 85 bilhões e uma despesa operacional ao redor de R$ 60 a 65 bilhões.

Fruto da mudança de cenário para o setor, as ações das empresas listadas em bolsa tiveram seus papéis valorizando em mais de 20%.  Espera-se que seus resultados no último trimestre de 2015 sejam muito bons.

Tereos inicia processo para comprar ações no mercado a um valor bastante atrativo aos minoritários.

Mais um caso do endividamento comendo o resultado operacional. No segundo trimestre da safra a USJ apresentou resultado positivo de quase R$ 155 milhões. Quando se coloca o financeiro, houve prejuízo de quase R$ 70 milhões.

 

O que acontece com nosso açúcar?

A produção acumulada de açúcar na safra está em 29,4 m.t., 6,42% abaixo de 2014/15.

Em novembro exportamos 2,35 m.t. de açúcar, 15,8% a mais que em mesmo período de 2014. Quando se considera o ano todo, a queda foi de 3,2%, com 21,1 m.t.

Segundo a Archer, cerca de 55% do açúcar a ser exportado (13 m.t.) está fixado a um preço médio de R$ 1172/t (13,57 cents/libra peso) com picos de R$ 1300/t.

A Índia segue atrapalhando o mercado mundial, com subsídio aos produtores para tentarem colocar 4 m.t. no mercado mundial. A boa notícia é que a produção deve cair 4,6%, descendo de 28,1 m.t. em 2014/15 para 26,8 m.t.

A Rússia, que já foi  um dos grandes compradores do mercado mundial, está muito perto da auto-suficiência, com a produção de açúcar de beterraba.

A União Europeia estima em 18 m.t. a produção após a mudança do regime de cotas de 2017. Isto representa um aumento de 15% da produção atual. Resta saber se com os atuais preços e os custos de produção na Europa, se isto se mantém por muito tempo.

Estima-se ligeira queda na produção chinesa e as importações de açúcar no ciclo 2015/16 podem chegar a 6 m.t.

A Indonésia deve importar em 2016 algo próximo a 3,25 m.t., contra 3,1 m.t. em 2015. Este crescimento é puxado pelo aumento do consumo de alimentos e bebidas.

Morgan Stanley projeta déficit de 3,7 m.t. no ciclo 2015/16.

Já existem estimativas de que o consumo na safra 2015/16 será de 175 m.t., e a produção chegaria a 170 m.t, derrubando em quase 5 m.t. os estoques.

 

O que acontece com nosso etanol?

O consumo acumulado de combustíveis no Brasil até o final de outubro estava 1% maior que o mesmo período de 2014. Nestes últimos meses, a queda tem sido entre 2 a 3%, mesmo assim o Sindicom aposta que cresça 1% em 2015.

A produção de etanol acumulada na safra está em 25,78 bilhões de litros. A venda pelas Usinas em novembro atingiu 2,517 b.l., sendo 1,570 b.l. de hidratado (300 milhões acima da safra anterior) e 946 m.l. de anidro. Estima-se o consumo de hidratado em 1,43 b.l. ainda um número elevado para enfrentar a entressafra.

Mesmo com a questão cambial, em novembro foram exportados 270 m.l. No acumulado até novembro, exportamos 1,57 b.l., 25% a mais que o mesmo período do ano passado.

Hoje temos 60% da frota de veículos leves no Brasil com motores flex. Devemos chegar a 80% em 2018.

Dados da ANP mostram crescimento de consumo de etanol no Brasil em quase 43% até o final de outubro.

O Governo anunciou na COP21 em Paris a meta de produção de 50 bilhões de litros de etanol em 2030, contra 28 bilhões de litros hoje. Com isto a participação do etanol na matriz energética seria de 16%. Para atingir este resultado, segundo a UNICA precisaremos de mais 75 novas Usinas, e um investimento de US$ 40 bilhões.

A subida recente de preços pode fazer com que a média desta safra chegue perto de R$ 1,40/l. Melhor que em 2014/15, mas ainda um valor insuficiente para os grupos que tiveram produtividade mais baixa e elevado endividamento. 

A Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) divulgou as metas de uso de combustíveis renováveis para 2016. Este aumentou para 68,54 bilhões de litros, 10,10% do total de combustíveis consumidos. O etanol de milho passa para 54,88 b.l. Já o etanol de cana enquadra-se na categoria de outros, que tem meta de uso de 5,6 b.l. Ou seja, se tiver produto e preço, temos mercado aberto ao etanol de cana nos EUA.

Documento enviado à Convenção das Nações Unidas para o clima pelo Governo Chinês impressiona pelos números prometidos em redução de emissões. Há um compromisso também de iniciar em 2017 o mercado de créditos de carbono.

Uma visão de longo prazo do Petróleo (baseado em texto de Martin Wolf, do Financial Times):

Os preços caíram mais de 50% entre julho de 2014 e o final de 2015.

A ideia de que o petróleo é um recurso esgotável pode estar sendo questionada. Basta dizer que o mundo consumiu nos últimos 35 anos 1 trilhão de barris e viu as reservas mundiais aumentarem em 1 trilhão de barris.

Estima-se que em 2035 a China importará 75% do seu consumo, e a Índia 90%, sendo os grandes importadores mundiais. Serão responsáveis por 60% do aumento da demanda até 2035.

A Agência Internacional de Energia prevê preços entre US$ 50 a US$ 80 o barril em 2020. Acredita que a super oferta que vivemos agora passará. No caso do cenário de 50, considera-se que os EUA continuarão produzindo à partir do xisto e a OPEP não reduzirá a oferta.

Passa a crescer a visão que o mundo tem mais petróleo que conseguirá queimar, se quiser fazer frente ao problema ambiental, e limitar a dois graus no máximo o acréscimo de temperatura global.

O petróleo de xisto é lucrativo na faixa de US$ 50 a US$ 60. Os EUA partiram de uma produção de quase zero em 2010 para 4,5 milhões de barris por dia em 2015. Expandiu quase que o dobro do crescimento da demanda mundial.

Como conclusão, se de um lado o petróleo mais barato afeta o etanol, o problema ambiental mundial se agravou e coloca o petróleo sob pressão, beneficiando os renováveis. Mas para isto, precisa de política pública, pois se depender da economia, o negócio é queimar petróleo.

Comentário Final:

Que ano complicado foi 2015. Para 2016, haja coração.  

Marcos Fava Neves é Professor Titular da FEA/USP, Campus de Ribeirão Preto.

Em 2013 foi Professor Visitante Internacional da Purdue University (EUA) e desde 2006 é Professor Visitante Internacional da Universidade de Buenos Aires. 

Compartilhar: