Leitura dos Fatos da Cana em Outubro de 2015

Leitura dos Fatos da Cana em Outubro de 2015

Por Marcos Fava Neves

O que acontece com nosso agro?

O índice de preços da FAO/ONU iniciou uma reação, após atingir maiores baixas dos últimos 4 anos. A  produção mundial de grãos 2015/16 está em 2,534 bilhões de toneladas, 24 milhões de toneladas (0,8%) mais baixa que 2014/15. O consumo segue firme, com 2,530 bilhões de toneladas, sendo 50% para ração animal. Vale dizer que aumentamos o consumo mundial de grãos em 31 milhões de toneladas (1%) no ano. Os estoques ainda estão altos, em 638 milhões de toneladas (25% do consumo anual). O novo câmbio deve fazer o Brasil plantar áreas recordes na safra 2015/16, mesmo com as dificuldades e o custo do crédito. Permanecendo neste patamar, o agro fortalecerá sua contribuição ao Brasil.

 

O que acontece com nossa cana?

O aumento do diesel, desnecessário pois este produto vendido pela Petrobras no mercado interno está ao redor de 10 a 15% mais caro que no exterior e estamos num país que precisa estimular a produção, trará ainda mais impacto de custos nas Usinas. Estima-se que para cada 10 litros de etanol gerados, 1 litro de diesel é necessário.

O Pro-renova, programa para renovação de canaviais do BNDES terá apenas metade do que foi alocado em 14/15, o que dificultará a renovação. Sinais do cobertor curto.

Finalizado o mês de setembro, a moagem de cana no Centro-Sul está em 444,3 milhões de toneladas, contra 441,44 milhões de toneladas processadas até setembro de 2014. Porém, São Paulo tem quase 12 milhões de toneladas de defasagem na moagem e pode não conseguir moer tudo.

O ATR até o final de setembro estava, na média da safra, em 132,16. Estamos 2,5% abaixo de 2014. Porém, o clima melhor elevou a produtividade média da safra para 85,3 toneladas/ha, 10% a mais que na safra anterior.

Entrevistando usineiros que considero muito eficientes e austeros, na safra 2014/15 o custo de se produzir açúcar foi de R$ 40 por saca, etanol hidratado 1,05/l e o anidro 1,15/l.

Mas... aí vem o dreno do setor: juros saltaram de 11,5 para 14,25% e câmbio de 3,20 a 3,80 - 4,00. De acordo com o Itaú-BBA, analisando 65 grupos que representam 75% do setor mostram que o endividamento cresceu 23% em um ano, pulando de mais de 46 para quase R$ 57 bilhões. Cerca de 43% do endividamento analisado pelo Banco está em dólar. A dívida pulou de 3,8 (em 2013/14) para 4,3 vezes o EBITDA em 2014/15 sendo que a dívida líquida atingiu 133 reais/tonelada de cana. Além da restituição da CIDE, uma ação coordenada dos agentes financeiros na estrutura de débitos de empresas que se mostrem competitivas do ponto de vista operacional e que não conseguem fazer frente ao endividamento do curto prazo é uma importante alternativa.

O relatório mais recente da EPE, ligada ao MME, mostra uma produção de cana de 792 milhões de toneladas em 2020 e de em 841 milhões de toneladas em 2024. Teríamos, de acordo com este material, uma produção de 47,6 milhões de toneladas de açúcar em 2024, com crescimento de 2,8% ao ano, com ATR de 142,8 e produtividade média de 85,3 t/ha. O consumo de etanol hidratado seria de 27 bilhões de litros, um crescimento anual de 6,8% ao ano e o anidro, um crescimento de 1,9% ao ano, chegando a 13 bilhões de litros.

 

O que acontece com nosso açúcar?

A OIA prevê déficit de 2,48 milhões de toneladas na safra 2015/16 e 6,2 milhões de toneladas na safra 2015/16, que começa em 1 de outubro.

A Czarnikow elevou a previsão de déficit de açúcar no ciclo 15/16 de 1,7 para 4,1 milhões de toneladas. Boa notícia, o consumo dos estoques deve ser mais rápido.

Para a Datagro, os preços do açúcar começam a subir com a relação estoque/consumo ao redor de 41%. Neste momento estão em 46%, e precisa de um déficit de 9 milhões de toneladas para chegar a 41%. Preveem déficit de 2,57 milhões de toneladas na ciclo 15/16.

O provável maior consumo e reajuste dos preços do etanol puxou para cima os preços do açúcar, que voltaram a passar de 14 centavos/libra peso. Há receio de um consumo mais alto na China (USDA acredita que a China importará ao redor de 5,5 milhões de toneladas na safra 2015/16 pois os baixos preços e altos custos de produção desestimulam o crescimento da produção chinesa) e teremos produções menores. Finalmente o açúcar reage.

Governo da Índia planeja algum tipo de subsídio para que as Usinas paguem os produtores de cana. A situação de endividamento por lá é enorme, reflexo dos preços baixos do açúcar. Estima-se a produção deste ano na Índia em 28 milhões de toneladas, contra 26,5 na safra passada. A demanda interna é de 25 milhões de toneladas. Planeja colocar de maneira subsidiada 4 milhões de toneladas no mercado internacional, pois o preço controlado interno é mais alto que o de exportação, o que representaria 8% do total transacionado, e já foi questionada na OMC pelos outros produtores. Há notícias mais recentes que este quadro pode mudar fortemente com a seca observada em algumas regiões, devido às monções estarem mais fracas. 

A partir de 2017 o açúcar pode ter mais um fantasma, a volta da Europa exportando para países do Norte da África. Porém, na Europa comenta-se que o break-even é ao redor de US$ 400 por tonelada. Não é muito eficiente no longo prazo. A Rússia está ao lado, e mais barata e estes devem melhorar a capacidade.

Com o novo câmbio a 3,8 – 4,0 reais, estima-se que cerca de 40% da produção de açúcar do ciclo 2015/2016 tenha sido vendida, e o preço travado em reais.  Preços que chegam a R$ 1300/tonelada.

Estamos em processo de mudança no açúcar, e considero este conjunto de notícias favorável.

 

O que acontece com nosso etanol?

Na ONU, o Brasil anunciou uma arrojada meta de reduzir as emissões de gases do efeito estufa em 37% até 2025. Deveremos ter 45% de renováveis na matriz energética, e o etanol está citado.

Este mês teve uma sequência de eventos favoráveis, a começar do inesperado aumento da gasolina (6%) anunciado pela Petrobras. Além de mostrar responsabilidade e ajudar no caixa da Petrobrás (a gasolina está 7,7% mais cara no Brasil), permitiu aumento dos preços de etanol.

Há estimativas que teremos etanol até o final da entressafra (31 de março) se o consumo não superar 1,2 bilhão de litros por mês. Portanto, forte reação nos preços é esperada, algo que nesta coluna falamos há seis meses. Pena que as usinas endividadas tiveram que vender aos preços médios que tivemos até o momento, que foram menores que em 2014/15. Mais uma destruição de valor no setor.

A Datagro soltou nova estimativa para a produção de etanol, que será recorde no ciclo 15/16: 30,45 bilhões de litros (17,62 bi de hidratado e 12,77 bi de anidro).

Em agosto a venda de etanol, segundo a ANP, cresceu 48,1%, deslocando consumo de gasolina, que caiu 11%. O diesel caiu 6%, o que mostra frenagem na produção. Segue com os mesmos números de 2015 o consumo geral no Brasil, de combustíveis.

Já os números de setembro são impressionantes. A UNICA estima o consumo em 1,59 bilhões de litros, 42% a mais que em 2014.

Com a dificuldade de se aprovar a volta da CPMF, ganha força a volta da incidência na CIDE na gasolina, o que poderia aumentar o valor do litro em quase 60 centavos. Pode ser encarado como um tributo de emissão de carbono. Aí, realmente a coisa vira...

Petrobrás anunciou corte de 50% dos investimentos previstos para o ano. Dos US$ 29 bilhões, serão investidos US$ 20 bilhões. Vem mais crise pela frente. Tenho esperança do dia que a Petrobrás vai anunciar um profundo corte de benefícios de seus funcionários, algo fora da realidade de qualquer país, muito mais do nosso, que é pobre. Apenas a área de comunicação da Petrobras emprega 1.200 funcionários, fora os terceirizados... Quanta gordura.

Segundo o CBIE, as perdas da Petrobrás com sua política errática de preços atingiu R$ 60 bilhões desde 2011. Mas começou a cair (chegou a R$ 77 bilhões) devido aos preçis internos agora maiores que os externos.

A ANP reviu a produção diária de petróleo no Brasil entre 2020 e 2022 de 4,5 milhões para 4 milhões de barris. Devemos ter problemas de abastecimento pela frente.

É necessário revermos a estrutura de comercialização do etanol. No estágio atual, ganhos logísticos não são totalmente capturados. A discussão deve envolver desde uma desregulamentação até a criação de blocos regionais de comercialização. É hora de mapearmos os pontos negativos e positivos para saber se esta ação pode contribuir com a geração de valor.

Datagro estimou exportações de etanol no ciclo 2015/16 em 1,8 bilhão de litros. Quase 80% a mais que a estimativa anterior, principalmente para a Califórnia, que pode chegar a quase 800 milhões de litros.

Etanol de segunda geração é uma solução, afinal quem não quer produzir 50% a mais na mesma área...

Não se comunica adequadamente o etanol no ponto de venda. Temos que bater no fato das externalidades positivas do etanol, que devem ser valorizadas e reconhecidas.

 

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