O Arrependimento da Festa

O Arrependimento da Festa

 

Marcos Fava Neves

Sabe aqueles dias em que você acorda de ressaca após uma festança acontecida na sua casa, e você ainda sem entender direito o que aconteceu, mas já tem certeza que não deveria ter dado esta festa, e gostaria que a casa já estivesse vazia para começar a organizar as coisas, fazer uma faxina para seguir em frente, mas na casa ainda tem visitas dormindo por todos os lados?

Uma sensação que dei uma festa sem poder, sem ser minha prioridade, gastei errado, gastei mais do que deveria, o povo veio, o clima estava legal, mas bebi demais, dei vexame e fui deitar. Apesar de não ter visita em casa hoje e não estar de ressaca, acordei com esta sensação estranha.

A humilhante derrota da nossa seleção, a pior que eu já vi, foi o final de uma festa, o dia em que uma parte do povo brasileiro vai cair na real. Uma festa com boa parte das coisas feitas de maneira errada.

Quem organiza uma festa, sabe que o mais gostoso é a expectativa pré-festa, curtir cada momento. Porém, esta foi uma festa em que não tivemos grande expectativa. Havia anos sabíamos que daríamos esta festa, mas deixamos a organização para os últimos momentos.

Foi uma Copa estranha, uma Copa de protestos, uma Copa onde sempre encontrei gente torcendo contra o nosso próprio time, com o argumento que estava torcendo pela mudança no país. Eu sempre acreditei que isto não teria interferência, torci muito pelo “time” e tenho esperança na mudança do país, mesmo se este tivesse vencido e convencido.

Levei diversas vezes filhos para trocarem figurinhas de jogadores, e nas bancas eu sentia um pouco o clima de Copa nas crianças, ingênuas, esperando por este grande evento do Brasil. Durante a surra de ontem, o que mais me doía era ver a cara das crianças, pois estas sim acreditaram na Copa.

A expectativa nossa era baixa com esta Copa, com esta festa. As pessoas acreditavam que muitas coisas dariam errado, que passaríamos vergonha. E passamos sim vergonha, dentro e fora do campo, exceto pelo fato que uma parte da nossa sociedade é boa anfitriã e uma parte do setor privado funcionou muito bem.

Na parte que toca ao nosso Governo não fomos bem. Deixamos tudo para o final, escolhemos 12 sedes, fizemos Estádios onde se errou feio nos orçamentos, obras caríssimas quando comparadas a outros países e entregues incompletas, e em algumas sedes os estádios podem ser ponto de encontro de calangos e mosquitos da dengue.

Obras estruturantes, obras de mobilidade foram muito poucas, e se feitas, não ficaram prontas a tempo, todas também com erros graves de orçamento. O terminal novo de Guarulhos está lá, mas passei quatro vezes por lá durante a Copa e não consegui usá-lo. Aquela sensação de coisa de última hora, mal feita, remendo, puxadinho.

Com o início da Copa e as coisas corriqueiras dando relativamente certo, Estádios cheios, povo brasileiro receptivo, fomos ganhando confiança, o Governo até reapareceu e tentou capturar em cima, até a trombada de 08 de julho, fatal, com sete golpes.

Fim de festa, e o brasileiro verá nos próximos meses a conta a pagar. A conta dos gastos da festa, a conta da quase parada das empresas durante este período, a conta da perda de produtividade durante dias de jogos e outros, cujos reflexos já estão ai.

Teremos dias difíceis pela frente. Nossa sociedade está deteriorada, está muito violenta e sem punição, esta vagabunda, esta sem comando. Perdeu alguns valores básicos. E depois de ontem, a auto-estima e a confiança desabaram.

Nossa economia não vai bem, estamos praticamente sem crescimento, na rabeira dos países emergentes, nossas empresas perdem competitividade diariamente, a praga da inflação está de volta, afinal, pouco fizemos para sermos competitivos.

Temos um sistema político assumidamente podre, Governo enorme, ineficiente, julgado corrupto, e para mim, o pior de tudo é que trata-se de um Governo mal direcionado, com visões de mundo e modelos de desenvolvimento ultrapassados, obsoletos.

Fim de festa, hora da limpeza. Resta pedir duas coisas à FIFA: se possível cancelar o jogo de terceiro e quarto colocado, para evitar mais um mal estar, afinal, não estou com vontade de ver mais uma vez algumas pessoas. e quem perde de 7 não deveria ter direito a jogar mais.

E, se for possível, antecipar a final para sexta ou no máximo sábado, para que possamos nos despedir amável e rapidamente dos estrangeiros, da turma que veio para a nossa festa, e que não tem culpa dos nossos problemas como sociedade, e começar a faxina necessária neste país. Esta é a minha sensação.

Do mesmo jeito que a maior dor de ontem foi ver a cara das crianças, minha dor diária quando as olho, advém do fato que nossa geração precisa deixar um país melhor para elas e estamos perdendo este jogo também. 

Amigos, temos que virar e vamos virar esta goleada. Depende de cada um de nós, uma ação coletiva de limpeza e de uma verdadeira reconstrução social.

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