Pimenta & Refresco

Yara Racy

31 Ago 2011 10:54

Recebi um release ontem com o seguinte assunto “Autor lança livro de biografias para Twitter”. Achei interessante e continuei a leitura intitulada: EM TEMPOS DE TWITTER, LIVRO REÚNE MIL BIOGRAFIAS COM ATÉ 140 CARACTERES. A sugestão de pauta chamou minha atenção e acabei lendo todo o email.

Muito educada, a assessora começou dando boa tarde e perguntando se estava tudo bem. Sim, estava. Até aquele momento.

“Você já imaginou escrever uma biografia em 140 caracteres?” Sugeria ela. “O autor Eduardo Diório Junior não só imaginou como realizou. O escritor acaba de lançar o livro “Mil Biografias Para Twitter” (Matrix Editora). A obra inclui a biografia de diversas personalidades, como artistas, políticos, jogadores de futebol, jornalistas, entre outros”, explicava o texto.

Até ali, tudo em ordem. A minha decepção veio em seguida, ao ler que, segundo o autor, “biografias são quase sempre longas e chatas”. Como assim? Como um escritor pode se autopromover fazendo esse tipo de depreciação de gênero?

Aliás, descrever a vida de uma pessoa em 140 caracteres nem pode ser comparado ao ato de escrever uma biografia (um trabalho bastante complexo – e útil -). A idéia do autor foi boa, não vou diminuir seu mérito, mas está mais próxima dos obituários do que propriamente das biografias. (continua...)


A justificativa das “biografias curtas” lançada no texto - ao menos para mim - não colou.

A essa altura, já estava “azeda” com as informações do e-mail. Mas não parou por ai. A percepção de se tratar de uma obra séria – até então impressa pelo texto – se desfez completamente na leitura dos exemplos de “biografias curtas e com muito bom humor” que poderiam ser encontradas no livro.

Ashton Kutcher – O cara casou com a Demi Moore, tira onda com famosos e foi o primeiro a bombar no twitter, com um milhão de seguidores. Ah! Diz que é ator.

Grazi Massafera – Ex-BBB mais bem sucedida de todos os tempos, além de ser a mais gostosa, claro! Agora é atriz e garota-propaganda de todo tipo de produto.

Meryl Streep – Basta a mulher botar a cara na tela, por menor que seja o papel, e já é indicada ao Oscar e ao Globo de Ouro. Até cantando Abba, imagine!

Rogério Ceni – Goleiro e sócio do São Paulo, sem paciência de ficar parado no fundo do estádio, sai e marca mais gols que a maioria dos jogadores por aí.Uma lástima.

Com sua dose de humor, não posso negar, mas uma lástima...

Pouco antes, no texto, a assessoria escrevia: “Você conseguiria descrever a vida de uma pessoa em apenas 140 caracteres? Esse foi o desafio do escritor Eduardo Diório Junior, que acaba de lançar o livro “Mil Biografias Para Twitter (Matrix Editora). O autor decidiu ir direto ao ponto e contar o que de mais importante aquela pessoa fez ao longo de sua vida ou carreira”.

Imaginem a sensação de Grazi Massafera ao constatar que o ápice de sua vida é “ser gostosa”, ou de Asthon Kutcher em perceber que não passa do “marido da Demi Moore”. E a consagrada Meryl Streep, chegaria a se sentir culpada, por sua dedicação e talento, que lhe renderam 16 indicações para o Oscar (dois conquistados) e 25 para o Golden Globe Awards (sete ganhos).

Vejam, não tenho nada contra o gênero humor, sem ele, inclusive, o mundo seria um lugar bastante desagradável. Apenas acho que há formas e formas de fazê-lo e, particularmente, aprecio as mais elegantes.

O que me desagrada mesmo é o desrespeito. Desrespeito pelas pessoas, pelos seus valores e esforços, e pelas atividades humanas realizadas com propósitos definidos, como a escrita de uma boa biografia ou de um bom release, por exemplo, que cumpra a sua finalidade de comunicação sem engodo.

Parafraseando Joseph De Maistre, acho que "cada cliente tem a assessoria de imprensa que merece" e vice-versa.

Um bom comunicador, na minha opinião, precisa estar atento ao seu trabalho. Refletir sobre ele. A vida é corrida, sim, e falta interpretação de texto nas escolas, também. Mas nada justifica não entregar a “Mensagem à Garcia” no final do dia. Certas coisas não podem simplesmente ser “embaladas para presente, e pronto”.

E só para finalizar, vou me impor o mesmo desafio proposto pelo autor no release. “Você conseguiria descrever a vida de uma pessoa em apenas 140 caracteres?” Posso tentar... Aqui vai então minha sugestão de “biografia curta” sobre o autor.

Eduardo Diório – professor, linguista, escritor, dramaturgo e produtor cultural, autor de contos e espetáculos teatrais premiados e de um e-book infantil.

Ah, não, assim não. Assim “não vende”... Ah, ta! Aqui vai outra então.

Eduardo Diório – o cara não sabe o que quer ser quando crescer, enquanto isso, vai brincando na internet e falando mal dos outros. Ah! Diz que é escritor.

Notem, minha intenção não é denegrir ninguém, polemizar nada, tampouco julgar o que não me convém. Estou apenas observando – crítica e reflexivamente, sim -, mas apenas observando, como o “modus operandi” humano tem nos conduzido a parâmetros cada vez menos significativos. É inclusive, por isso, que, muitas vezes, deixo de escrever no blog, justamente pelo receio de estar sendo imprudente e tratando determinados assuntos sem o aprofundamento que eles merecem.

Por hoje é só.
Bjs