Direito à juventude

Direito à juventude

Mais estudos de e com as juventudes, e maior investimento em ações para formação de leitores jovens, são caminhos apontados pelo professor Elmir para um melhor diálogo entre gerações

Professor, doutor, docente e pesquisador da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, junto ao Departamento de Educação, Informação e Comunicação — FFCLRP-DEDIC, Elmir de Almeida desenvolve estudos e pesquisas nas áreas da Educação escolar e não escolar e as relações da juventude com as áreas da educação e da cultura e nesta entrevista para a Revide comenta um pouco sobre o universo jovem, a importância da leitura para a formação humana e o escasso interesse da pesquisa acadêmica pela construção de cultura juvenil.
 


Nesta edição, a Revide inicia um novo projeto, voltado para o público jovem. Qual a sua avaliação desta iniciativa?


Parabenizo a Revide pela iniciativa de conceber e querer colocar em movimento um projeto para interagir e dialogar com os jovens. Trata-se de uma possibilidade com potencial para atender a uma necessidade das juventudes, aquela que compreende o acesso e a fruição da literatura como um direito humano e de cidadania. Do meu ponto de vista, a Revide faz literatura, e julgo extremamente pertinente e necessários projetos de literatura para o estabelecimento de diálogo com os jovens, ancorados em diferentes situações e com múltiplos pertencimento. Antonio Candido defendeu a literatura como um direito humano, vinculado à cultura e este acesso, além de ser a expressão da garantia de um direito, significa também um investimento em processos formativos, de socialização e educação (não necessariamente escolares), dos membros das novas gerações.

 

E qual a importância da formação do público leitor jovem?


Se admitirmos que a literatura é um direito humano e um direito de cidadania que deve ser garantido aos integrantes das diferentes gerações por instituições e políticas públicas; se admitirmos que a literatura atende a uma necessidade básica de crianças, adolescentes, jovens, jovens-adultos, adultos e velhos, tal como as necessidades básicas de alimentação, moradia, educação, cultura e saúde etc; se admitirmos que a literatura contribui para que os indivíduos em geral e os indivíduos juvenis consigam produzir leituras mais alargadas, aprofundadas e críticas da realidade em que se encontram e do mundo social em que vivem; se admitirmos que a literatura é um dos caminhos de humanização dos seres humanos, tal como afirma Antonio Candido (1988), então temos aí as respostas para investirmos política, ética, moral e culturalmente na formação do jovem como um leitor.


 
O que falta, na sua opinião, para que os jovens leiam mais e se interessem mais pelo consumo dos meios de comunicação noticiosos?


Objetivamente falando, o que falta é que os adultos e suas instituições, que as políticas públicas setoriais de educação e de cultura, também as políticas de e com as juventudes, entrem em real interlocução com representantes dos coletivos juvenis — estudantis e não estudantis —, que invistam e criem programas e projetos de acesso e fruição do livro, da leitura e da literatura; criem projetos de estímulo e formação contínua de novos coletivos de leitura em diferentes suportes; invistam e criem projetos e programas que sejam concebidos e implementados  na chave dos direitos humanos e dos direitos da cidadania. E, sobretudo, que os programas e projetos tenham continuidade, de modo que possamos acompanha-los, avalia-los e mensurar o alcance e os desafios com que se deparam na garantia do atendimento das demandas e necessidades dos  jovens, em  diferentes etapas de sua implementação e avaliação, de sorte que eles sejam efetivamente exitosos. 

 

Qual a distinção entre jovem e juventude?


Quando discutimos o indivíduo jovem, precisamos ter algumas cautelas, entre elas a que faz uma certa sociologia, que nos orienta a distinguir entre o termo juventude e o termo jovem. A juventude é uma estação do curso de vida, assim como a infância, a adultez e a velhice. Quando se coloca em debate o público jovem, estamos fazendo uma referência ao sujeito que vive a fase da vida que chamamos de juventude, um período reconhecido e legitimado por determinadas sociedades, para que os jovens vivam, sem outras responsabilidades,  processos variados de formação, de busca por autonomia e preparação para responsabilidades próprias do mundo adulto. Em sociedades como a nossa, com  desigualdades estruturais de longa duração, não são todos os jovens que têm o direito à juventude — como formação, experimentação e preparação —, ou nem todos os jovens conquistam e fruem dos direitos de cidadania e direitos humanos de forma equitativa e justa. É preciso considerar, sempre, que há jovens oriundos de diferentes classes sociais; negros, pardos, brancos, indígenas; mulheres e homens, que vivenciam a juventude a partir de diferentes orientações afetivas e sexuais; há jovens do meio urbano e rural. Há muitas situações e pertencimentos que marcam as vivencias dos jovens brasileiros na experiência da juventude. 

 

O que falta e o que sobra ao jovem na atualidade, na sua percepção?


Do meu ponto de vista, para os jovens do presente, faltam a conformação, execução e consolidação de políticas públicas, com uma efetiva escuta sensível dos jovens, nos setores da educação, da cultura, da saúde, do esporte, do lazer, da moradia, do primeiro emprego e geração de renda.  E falta, ainda, um esforço concertado entre os governos federal, estaduais e municipais pela conformação, implementação e consolidação de políticas públicas de e com as juventudes. 


Sobre as culturas juvenis, quais são mais comuns em Ribeirão Preto e qual a sua avaliação deste cenário?


Quando cheguei em Ribeirão Preto, em 2006, tive a impressão de que os programas de pós-graduação situados na localidade e em seu entorno pouca atenção dava às chamadas “culturas juvenis”, organizadas em termos de grupos de estilos musical, de artes cênicas, artes gráficas, leitura, literatura, ecológicos, religiosos, esportes radicais, entre outros. Todavia, empiricamente constatava que jovens ribeirão-pretanos se organizavam em torno das linguagens do movimento hip hop (o rap, o grafite, o break e os MC’s), do punk, do rock, do funk, dos carecas, da música sertaneja, da leitura, ecológicos, socioambiental e, mais recentemente, em torno dos saraus e do slam. Avalio que há escasso interesse da pesquisa acadêmica por esses jovens, as formas e os sentidos pelos quais eles se agrupam, constroem culturas juvenis, seus modos de aparecimento e ocupação do espaço público e como elas interagem com a educação escolar. 

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